sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Feliz 2012!

Prezadas e prezados amigos,

Estudemos com atenção o texto de André Luiz, contendo preciosas recomendações para o novo ano que está chegando.

Bons estudos!
Feliz 2012!
Carla e Hendrio



Ingredientes do êxito

O êxito espera por você, tanto quanto, vem exaltando quantos lhe alcançaram as diretrizes.
Largue qualquer sombra do passado ao chão do tempo, qual a árvore que lança de si as folhas mortas.

 Foto: Hendrio Belfort

Não se detenha, diante da oportunidade de servir.
Mobilize o pensamento para criar vida nova.
Melhore os próprios conhecimentos, estudando sempre.
*
Saliente qualidades e esqueça defeitos.
Desenvolva os seus recursos de simpatia e evite qualquer impulso de agressão.
Se você pode ajudar, em auxílio de alguém, faça isso agora.
Enriqueça o seu vocabulário com boas palavras.
Aprendendo a escutar, você saberá compreender.
*
A melhor maneira de extinguir o mal será substituí-lo com o bem.
Destaque os outros e os outros destacarão você.
Viva o presente, agindo e servindo com fé e alegria, sem afligir-se pelo futuro, porque, para viver amanhã, você precisará viver hoje.
Habitue-se a sorrir.
Recorde que desalento nunca auxiliou a ninguém.
Não permita que a dificuldade lhe abra porta ao desânimo porque a dificuldade é o meio de que a vida se vale para melhorar-nos em habilitação e resistência.
Ampare-se amparando os outros.
Censura é uma fórmula das mais eficientes para complicar-se.
Abençoe a vida e todos os recursos da vida onde você estiver.
Nunca desconsidere o valor da sua dose de solidão, a fim de aproveitá-la em meditação e reajuste das próprias forças.
Observe: todo o tempo é tempo de Deus para restaurar e corrigir, começar e recomeçar.


André Luiz

XAVIER, Francisco Cândido. “Respostas da vida”. Pelo Espírito André Luiz. 9. ed. São Paulo, SP: IDEAL. 1980. Capítulo 3.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Ante o Natal

625. Qual o tipo mais perfeito que Deus tem oferecido ao homem, para lhe servir de guia e modelo?
“Jesus” (O Livro dos Espíritos)
Considerando a alta significação do Natal em tua vida, podes ouvir e atender os apelos dos pequeninos esquecidos no grabato da orfandade ou relegados às palhas da miséria, em memória de Jesus quando menino; consegues compreender as dificuldades dos que caminham pela via da amargura, experimentando opróbrio e humilhação e dás-lhes a mão em gesto de solidariedade humana, recordando Jesus nos constantes testemunhos; abres os braços em socorro aos enfermos, estendendo-lhes o medicamento salutar ou o penso balsamizante, desejando diminuir a intensidade da dor, evocando Jesus entre os doentes que O buscavam, infelizes; ofereces entendimento aos que malograram moralmente e se escondem nos recantos do desprezo social, procurando-os para os levantar, reverenciando Jesus que jamais se furtou à misericórdia para os que os foram colhidos nas malhas da criminalidade, muitas vezes sob o jugo de obsessões cruéis; preparas a mesa, decoras o lar, inundas a família de alegrias e cercas os amigos de mimos e carinho pensando em Jesus, o Excelente Amigo de todos...

Tudo isto é Natal sem dúvida, como mensagem festiva que derrama bênçãos de consolo e amparo, espalhando na Terra as promessas de um Mundo Melhor, nos padrões estabelecidos por Jesus através das linhas mestras do amor.

Há, todavia, muitos outros corações junto aos quais deverias celebrar o Natal, firmando novos propósitos em homenagem a Jesus.

Companheiros que te dilaceraram a honra e se afastaram; amigos que se voltaram contra a tua afeição e se fizeram adversários; conhecidos caprichosos que exigiram alto tributo de amizade e avinagraram tuas alegrias; irmãos na fé que mudaram o conceito a teu respeito e atiraram espinhos por onde segues; colaboradores do teu ideal, que sem motivo se levantaram contra teu devotamento, criando dissensão e rebeldia ao teu lado; inimigos de ontem que se demoram inimigos hoje; difamadores que sempre constituíram dura provação. Todos eles são oportunidade para a celebração do Natal pelo teu sentimento cristão e espírita.
Foto: Hendrio Belfort

Esquece os males que te fizeram e pede-lhes te perdoem as dificuldades que certamente também lhes impuseste.

Dirige-lhes um cartão colorido para esmaecer o negrume da aversão que os manteve em silêncio e à distância nos quais, talvez, inconscientemente te comprazes.

Provavelmente alguns até gostariam de reatar liames... Dá-lhes esta oportunidade por amor a Jesus, que a todo instante, embora conhecendo os inimigos os amou sem cansaço, oferecendo-lhes ensejos de recuperação.

O Natal é dádiva do Céu à Terra como ocasião de refazer e recomeçar.

Detém-te a contemplar as criaturas que passam apressadas. Se tiveres olhos de ver percebê-las-ás tristes, sucumbidas, como se carregassem pesados fardos, apesar de exibirem tecidos custosos e aparência cuidada. Explodem facilmente, transfigurando a face e deixando-se consumir pela cólera que as vence implacavelmente.

Todas desejam compreensão e amor, entendimento e perdão, sem coragem de ser quem compreenda ou ame, entenda ou perdoe.

Espalha uma nova claridade neste Natal, na senda por onde avanças na busca da Vida.

Engrandece-te nas pequenas doações, crescendo nos deveres que poucos se propõem executar.

Desde que já podes dar os valores amoedados e as contribuições do entendimento moral, distribui, também, as joias sublimes do perdão aos que te fizeram ou fazem sofrer.

Sentirás que Jesus, escolhendo um humílimo refúgio para viver entre os homens semeando alegrias incomparáveis, nasce, agora, no teu coração como a informar-te que todo dia é natal para quem o ama e deseja transformar-se em carta-viva para anunciá-lo às criaturas desatentas e sofredoras do mundo.

Somente assim ouvirás no imo d’alma e entenderás a saudação inesquecível dos anjos, na noite excelsa:

“Glória a Deus nas alturas, paz na terra, boa vontade, para com os homens” — vivendo um perene natal de bênçãos por amor a Jesus.

Joanna de Ângelis

FRANCO, Divaldo P. “Espírito e Vida”. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. 2ªed. Salvador, BA: LEAL, 1978. Capítulo “Ante o Natal”.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

O Céu e o inferno

“O Reino de Deus não vem com aparência visível. Nem dirão: Ei-lo aqui! ou: Ei-lo ali! porque o reino de Deus está dentro de vós.” (Lucas 17:20-21)

Céu
Allan Kardec, em sua obra “O Céu e o Inferno” [1], explica que o termo céu vem do grego coilos, passando para o latim cœlum, ambas as palavras significando “côncavo”. Na Antiguidade, cria-se que o Universo girava em esferas com a Terra em seu centro, sendo cada esfera vista de nosso Planeta como um côncavo. Nosso entendimento sobre a posição da Terra frente ao Universo muito já se modificou; amadureçamos, também, nossa visão de mundo sobre o que sejam céu e inferno.

Paraíso
A metáfora de o céu ser um local do Universo destinado aos escolhidos por Deus tem frequente associação ao termo paraíso. Em sua origem, porém, tanto o termo céu como paraíso não significavam isso. O pesquisador Carlos Torres Pastorino [2] pondera, a respeito da palavra paraíso:
“A palavra PARAÍSO, transcrição do persa pairi-daêza, é encontrada várias vezes no Antigo Testamento, com o sentido de ‘jardim plantado’, de ‘bosque’ ou ‘pomar’ amenos, mas sempre no solo da Terra, e não flutuando entre as nuvens. (...) Em outros passos no Antigo Testamento encontramos o termo parádeisos como local físico de deleite ameno: (...) “Os teus renovos são um pomar [parádeisos] de romãs, com frutos preciosos (...)” (Cânticos 04:13)
Percebemos, nessa passagem de Cânticos, a associação entre os frutos do trabalho de uma pessoa (seus renovos) e uma ambiência harmônica à sua volta, a começar em seu mundo interior.

Felicidade
“Estar no Céu” é, portanto, um estado de harmonia espiritual, sempre condicionado ao Bem que praticarmos, independente de nossa localização. Essa é a aplicação prática do ensino constante do Salmo 62 e depois corroborado por Jesus:
“A cada um segundo as suas obras.” (Salmos 62:12; Mateus 16:27)
A respeito da relação entre felicidade, prática constante do Bem e evolução, Kardec pondera:
“A felicidade está na razão direta do progresso realizado (...). Sendo a felicidade dos Espíritos inerente às suas qualidades, haurem-na eles em toda parte em que se encontram, seja à superfície da Terra, no meio dos encarnados, ou no Espaço. (...) A felicidade dos Espíritos bem-aventurados não consiste na ociosidade contemplativa (...). A vida espiritual em todos os seus graus é, ao contrário, uma constante atividade, mas atividade isenta de fadigas.” [3]

Onde está o Céu?
O Codificador da Doutrina Espírita conclui a respeito dessa questão:
“Em toda parte. Nenhum contorno lhe traça limites. Os mundos adiantados são as últimas estações do seu caminho, que as virtudes franqueiam e os vícios interditam. (...) Comparados à Terra, esses mundos são verdadeiros paraísos (...). Sendo a Terra um mundo inferior destinado à purificação dos Espíritos imperfeitos, está nisso a razão do mal que aí predomina, até que praza a Deus fazer dela morada de Espíritos mais adiantados.” [4]
À medida que evoluímos moral e intelectualmente, trabalhamos para conquistar o acesso a mundos mais adiantados, nos quais novas e superiores lições nos aguardam. Não obstante, o Céu é um estado de harmonia íntima: onde quer que estejamos, com nossa consciência tranquila pela prática de todo o Bem ao nosso semelhante que estiver ao nosso alcance, bem como buscando a sintonia com a Espiritualidade Superior pela prece, sempre estaremos num paraíso, ou seja, nosso ambiente espiritual estará tranquilo como um jardim ameno.
A respeito dos diferentes graus evolutivos de mundos, aconselhamos a leitura de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, no seu capítulo III (“Há muitas moradas na casa de meu Pai”), itens 03 a 05 (“Diferentes categorias de mundos habitados”). [5]

O “mundo inferior”
A expressão acima vem do latim infernum, também significando “profundezas”. A elevação de pensamento proporcionada pelo Bem se inicia no Espírito. De forma análoga, o rebaixamento vibratório pela ausência da prática do Bem é um estado de desarmonia no mundo interior, refletindo, também, no ambiente em que a pessoa se localiza, por afinidade com outros Espíritos em condição similar de pensamento, palavras e atos.

Causa e efeito
Na Antiguidade, não havia uma noção clara sobre a existência de um mundo espiritual; só se entendia o que fosse do mundo físico, e, assim, também físicas deveriam ser as consequências de quaisquer atos nossos. Na análise de Allan Kardec, lemos:
“Desde todas as épocas o homem acreditou, por intuição, que a vida futura seria feliz ou infeliz, conforme o bem ou o mal praticado neste mundo. (...) o homem primitivo naturalmente moldou o seu futuro pelo presente (...). Não estando ainda desenvolvido o sentido que mais tarde o levaria a compreender o mundo espiritual, não podia conceber senão penas materiais; e assim, com pequenas diferenças de forma, os infernos de todas as religiões se assemelham.” [6]
Nossa visão de mundo evoluiu; já nos é possível compreender a transcendência da vida. Tratemos, então, de também evoluir nossa visão de mundo acerca da lei de causa e efeito. Eliminando a causa de dores morais, ou seja, buscando constantemente a prática da Lei Divina e nos mantendo em paz com a consciência, local onde encontra-se inscrita a Lei de Deus (“O Livro dos Espíritos”, questão 621), eliminam-se, também, as causas de quaisquer sofrimentos, incluindo as dores físicas, as quais cessarão quando não mais precisarmos desses alertas para nossa retificação moral.

Inferno e medo
A figura de um local do Universo destinado a abrigar os que “ofenderam a Deus”, bem como a existência de um ou mais seres com poder para se opor a Deus e “roubar-lhe” almas, são ideias contrárias à do Criador infinitamente justo, inteligente e bom. Toda a Sua criação, tanto o espaço como os Espíritos, estão em constante evolução. Apesar disso, essas imagens têm sido, há muito tempo, utilizadas também como instrumentos para incutir medo e obter controle sobre as pessoas. Isso não é eficaz, não é caridoso e é desnecessário; não necessitamos de instrumentos de opressão para nos impelir à evolução. Esse tipo de recurso tem relação com a Humanidade primitiva, como analisa Kardec:

“(...) o homem é comumente mais sensível ao mal que ao bem; este lhe parece natural, ao passo que aquele mais o afeta. Nem por outra razão se explica, nos cultos primitivos, as cerimônias sempre mais numerosas em honra ao poder maléfico: o temor suplanta o reconhecimento.” [7]
Eis um desafio importante à nossa Humanidade atual, vivendo em um planeta em transição para mundo de Espíritos regenerados. Em vez de buscarmos o Bem, ainda precisamos temer o mal para contermos e eliminarmos nossas más tendências? Está na hora de o reconhecimento e busca pela prática do Bem ser-nos muito mais relevante do que o temor do mal.
O uso de figuras diabólicas como instrumento de controle pelo medo é ilustrado por André Luiz, no livro “Ação e Reação” [8], relatando a situação de uma mulher atormentada com a figura de um “demônio”, divulgada em livro do século XIX com a concordância de autoridades religiosas. Além de ser uma publicação não caridosa, esses tipos de imagem são utilizados por Espíritos temporariamente focados no mal, os quais podem modificar seu perispírito, seu corpo de matéria sutil, modelável pelo pensamento, e assumir essas formas assustadoras, implicando sofrimentos como o relatado nessa obra.
Devemos, também, ponderar que a ameaça do inferno não é eficaz para todos os encarnados. Esse recurso é especialmente inútil para os materialistas e para os mais intensamente ligados ao mal. Podemos concluir isso através do depoimento, trazido por via mediúnica, de Jacques Latour, um criminoso condenado à morte, a qual não temia por crer que, quando morresse, tudo acabaria, inclusive qualquer cobrança por seus erros — o que se verificou totalmente diferente de suas expectativas, pois a vida continua. Nas palavras de Jacques Latour:

“(...) Ora; um grande malfeitor não é um Espírito pusilânime, e o temor de um polícia é para ele mais real que a descrição dos tormentos do inferno. (...) Como insinuar (...) que uma alma, isto é, uma coisa imaterial, possa sofrer ao contato do fogo material? (...) por isso tantos e tantos criminosos se riem desses painéis fantásticos do inferno. O mesmo, porém, não se dá quanto à dor moral do condenado, após a morte física. Orai para que o desespero não se aposse de mim.” [9]

Do medo para a caridade
A Doutrina Espírita é o Consolador prometido por Jesus. Consolar é a união de dois termos do latim: cum + solis, ou seja, com + sol. O Sol é nossa referência de energia vital e calor; daí a expressão consolar ter o significado de levar iluminação e vitalidade às almas.
Cuidemos para nós, espíritas, não fazermos a mesma abordagem de medo das crenças primitivas, detalhando quadros terríveis de locais como o “vale dos suicidas” ou de obsessores implacáveis! Cada pessoa é uma história em particular; não há “tabela” no planejamento das vidas dos Espíritos, determinando que tais atos implicarão tanto tempo em determinado lugar; isso é abordagem coerente com as crenças primitivas do inferno, nas quais todos pagam da mesma forma, seja por que erro e em que contexto tenha ocorrido. Não mais necessitamos orientar pelo medo do mal, mas sim compartilhando o pouco que sabemos sobre a infinita evolução no Bem que aguarda a todos.

Sofrimentos “eternos”
Uma ideia comumente associada ao mito primitivo de inferno é o dos sofrimentos sem fim; a imagem de queimar “para sempre” num fogo que nunca apaga. Analisemos as palavras de Jesus:

“Se a tua mão te servir de pedra de tropeço [skándalon], corta-a; melhor é entrares na vida aleijado do que, tendo as duas mãos, ires para a geena, para o fogo inextinguível.” (Marcos 09:43)
Essa passagem evangélica traz importantes lições sobre a vida ser um processo, o qual demanda evolução constante, e não um projeto com início em nossa concepção, seguido de algumas décadas de existência e findo com a morte do corpo físico. O estado atual de nossa existência decorre do que fizemos com nossos recursos anteriormente. Se fizemos mau uso de um dos tantos presentes de Deus, não só recursos físicos como a mão, mas recursos espirituais como a inteligência, e se optamos por não aprender pelo amor, ou seja, pela prática do Bem, aprenderemos pela dor, ou seja, privados de algum recurso por algum tempo, para meditarmos sobre a falta que ele nos fez e buscarmos conquistar novamente o direito de dispor do mesmo.
A respeito da questão de penas “eternas”, como o “fogo inextinguível”, sugerimos a leitura da postagem “Penas ‘Eternas’”, neste Blog, contendo diversas citações da Codificação Espírita relativamente a esse tema. Por ora, atenhamo-nos à questão do fogo, a geena citada por Jesus.
O termo geena deriva da expressão hebraica Geh Ben Hinnóm, ou “Vale dos filhos de Hinom”, citada, por exemplo, no segundo livro de Reis. Trata-se de um vale, localizado junto à cidade de Jerusalém. Antes de os hebreus lá residirem, este vale era utilizado para rituais ao deus pagão Moloch, os quais consistiam em sacrifícios humanos utilizando fogo. O povo judeu utilizou este vale para incinerar o lixo da cidade de Jerusalém, bem como para queimar os corpos de indigentes e condenados à morte. Esse vale foi, portanto, um lugar por muito tempo associado ao fogo e a queimar criminosos. Por isso Jesus referiu a geena como um lugar de sofrimento. Vemos, à figura abaixo, como é a geena atualmente. Se a geena evoluiu, também nós evoluamos nossa visão sobre ela, bem como nosso entendimento de mundo.


Vale dos filhos de Hinom (Geena) [10]

Uma vez que eterno significa, em seu sentido original, algo de duração desconhecida ou entendida como muito grande, nós é que determinamos o tempo em que permaneceremos em algum sofrimento: quando abrirmos mão do orgulho e do egoísmo, dando lugar à humildade e ao altruísmo, nossas dores morais se abrandarão, com reflexos positivos em todos os aspectos de nossas vidas.
Não nos percamos em questões semânticas. Um dos princípios da Doutrina Espírita é o de que Deus é eterno, e, para Ele, utilizamos o sentido mais recente da palavra; ou seja, Deus não teve início nem terá fim. De forma coerente com o outro princípio doutrinário, qual seja, o de Deus ser a suprema justiça, inteligência e bondade, é lógico, para a questão de penas e sofrimentos, utilizarmos o sentido original de eterno, qual seja, o de uma duração desconhecida. Lembremos de trecho da resposta à questão 28 de “O Livro dos Espíritos”:

“Compete-vos a vós formular a vossa linguagem de maneira a vos entenderdes. As vossas controvérsias provêm, quase sempre, de não vos entenderdes acerca dos termos que empregais, por ser incompleta a vossa linguagem para exprimir o que não vos fere os sentidos.”

Agrupamentos por afinidades
Céu e inferno são, antes de tudo, estados de Espírito. Mesmo assim, há locais onde se agrupam Espíritos de acordo com suas afinidades. Há, portanto, cidades e mundos onde vivem Espíritos harmonizados, bem como locais onde temporariamente se agregam seres em sofrimento moral e físico. Isso não implica que esses últimos locais servirão “para sempre” como “infernos” ou “purgatórios”; tudo evolui; o mal é temporário e o Bem é definitivo.
Analisemos um diálogo entre Clarêncio e André Luiz [11] a esse respeito:

“– Orgulho, vaidade, tirania, egoísmo, preguiça e crueldade são vícios da mente, gerando perturbações e doenças em seus instrumentos de expressão.
– É por isso que temos os vales purgatoriais, depois do túmulo... a morte não é redenção...
– Nunca foi (...). O pássaro doente não se retira da condição de enfermo, tão só porque se lhe arrebente a gaiola. O inferno é uma criação de almas desequilibradas que se ajuntam, assim como o charco é uma coleção de núcleos lodacentos, que se congregam uns aos outros.”

Purgatório
André Luiz, em sua reflexão, cita os “vales purgatoriais”. Como a Doutrina Espírita analisa a figura do purgatório? Estudemos as palavras de Kardec:

“Em cada existência, uma ocasião se depara à alma para dar um passo avante; de sua vontade depende a maior ou menor extensão desse passo: franquear muitos degraus ou ficar no mesmo ponto. (...) É, pois, nas sucessivas encarnações que a alma se despoja das suas imperfeições, que se purga, em uma palavra, até que esteja bastante pura para deixar os mundos de expiação como a Terra, onde os homens expiam o passado e o presente, em proveito do futuro.” [12]

Preparo na Luz para superar as sombras
Ninguém jamais está desamparado. Mesmo os Espíritos em situação moral mais degradada continuam a ser filhos do mesmo Deus, amados por Ele, o qual criou a todos fadados à evolução no caminho da perfeição. Sendo assim, mesmo nos lugares onde temporariamente convivem os sentimentos e pensamentos mais deprimentes, há Espíritos focados no Bem, auxiliando a todos que se cansem do mal, pois o mal se consome por si mesmo.
Nos locais onde as sombras são mais densas, mais preparados na Luz são os Espíritos que atuam em missões de consolação e amparo. Na obra “No Mundo Maior”, André Luiz exprime sua vontade de acessar abismos purgatoriais para relatar o que observaria em seus livros. A diretora dos trabalhos, Cipriana, orienta:

“(...) a sugestão (...) é valiosa, em se tratando de observações preliminares no Baixo Umbral. Como responsável, porém, pelos serviços diretos da expedição, não posso admiti-lo, por enquanto, em todas as particularidades. (...) Nosso estimado André não tem o curso de assistência aos sofredores nas sombras espessas.” [13]
Onde houver dores morais mais intensas, tanto mais preparados no Bem são os Espíritos atuando na assistência àqueles irmãos em Deus. Podemos fazer uma analogia com um centro médico de alta complexidade, no qual enfermidades graves são objeto de atenção de equipes altamente preparadas.
Preparemo-nos, também nós, na prática do Bem, buscando orientação para bem praticá-lo através da prece, visando a auxiliar a nós mesmos e ao nosso semelhante, erigindo o Céu em nós, em nosso ambiente e em nosso mundo.


Leia também, neste Blog, as postagens “O Bem e o Mal”, “A Influência de ‘Maus’ Espíritos” e “Penas ‘Eternas’”.




Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:
 [1] KARDEC, Allan. “O Céu e o Inferno”. 37.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Primeira parte, capítulo III (“O céu”), item 01.
[2] PASTORINO, Carlos Torres. “Sabedoria do Evangelho”. Rio de Janeiro, RJ: Sabedoria, 1964. Volume 8, capítulo “Zombarias”.
[3] KARDEC, Allan. “O Céu e o Inferno”. 37.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Primeira parte, capítulo III (“O céu”), itens 06 e 12.
[4] Ibidem. Itens 11 e 18.
[5] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Capítulo III (“Há muitas moradas na casa de meu Pai”), itens 03 a 05 (“Diferentes categorias de mundos habitados”).
[6] KARDEC, Allan. “O Céu e o Inferno”. 37.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Primeira parte, capítulo IV (“O inferno”), itens 01 e 02;
[7] Ibidem. Capítulo IX (“Os demônios”), item 3;
[8] XAVIER, Francisco Cândido. “Ação e Reação”. Pelo Espírito André Luiz. 28.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 2007. Capítulo 04.
[9] KARDEC, Allan. “O Céu e o Inferno”. 37.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Segunda parte, capítulo VI (“Criminosos arrependidos”), depoimentos de Jacques Latour, itens I e III.
[10] Wikipédia. Palavra Geena. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Geena. Acesso em 06/out/2011.
[11] XAVIER, Francisco Cândido. “Entre a Terra e o Céu”. Pelo Espírito André Luiz. 17.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1997. Capítulo XXI.
[12] KARDEC, Allan. “O Céu e o Inferno”. 37.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Primeira parte, capítulo V (“O purgatório”), item 4.
[13] XAVIER, Francisco Cândido. “No Mundo Maior”. Pelo Espírito André Luiz. 20ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1995. Capítulo 17.



quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Considerações sobre o aborto induzido (3)

Complementando nossos estudos anteriores acerca do tema (leia as postagens “Considerações sobre o aborto induzido e “Considerações sobre o aborto induzido (2)”, apresentamos algumas reflexões importantes sobre a questão do aborto dos ditos anencéfalos.

Convidamos a assistir ao filme “Quantos ‘Eu te amo...’”, do diretor Halder Gomes, bem como a estudar o texto “Pequena nota sobre o direito a viver”, de autoria de Eros Roberto Grau, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal. Este texto foi publicado na Revista Reformador de setembro de 2011.


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Pequena nota sobre o direito a viver
Eros Roberto Grau


Inventei uma história para celebrar a Vida. Ana, filha de família muito rica, apaixona-se por um homem sem bens materiais, Antonio. Casa-se com separação de bens. Ana engravida de um anencéfalo e o casal decide tê-lo. Ana morre de parto, o filho sobrevive alguns minutos, herda a fortuna de Ana. Antonio herda todos os bens do filho que sobreviveu alguns minutos além do tempo de vida de Ana. Nenhuma palavra será suficiente para negar a existência jurídica do filho que só foi por alguns instantes além de Ana.

A história que inventei é válida no contexto do meu discurso jurídico. Não sou pároco, não tenho afirmação de espiritualidade a nestas linhas postular. Aqui anoto apenas o que me cabe como artesão da compreensão das leis. Palavras bem arranjadas não bastam para ocultar, em quantos fazem praça do aborto de anencéfalos, inexorável desprezo pela vida de quem poderia escapar com resquícios de existência e produzindo consequências jurídicas marcantes do ventre que o abrigou.

Matar ou deixar morrer o pequeno ser que foi parido não é diferente da interrupção da sua gestação.Mata-se durante a gestação, atualmente, com recursos tecnológicos aprimorados, bisturis eletrônicos dos quais os fetos procuram desesperadamente escapar no interior de úteros que os recusam.Mais “digna” seria a crueldade da sua execução imediatamente após o parto,mesmo porque deixaria de existir risco para as mães. Um breve homicídio e tudo acabado.

Vou contudo diretamente ao direito, nosso direito positivo. No Brasil o nascituro não apenas é protegido pela ordem jurídica, sua dignidade humana preexistindo ao fato do nascimento, mas é também titular de direitos adquiridos. Transcrevo a lei, artigo 2º do Código Civil:

A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

No intervalo entre a concepção e o nascimento dizia Pontes de Miranda “os direitos, que se constituíram, têm sujeito, apenas não se sabe qual seja”. Não há, pois, espaço para distinções, como assinalou o ministro aposentado do STF, José Néri da Silveira, em parecer sobre o tema:

Em nosso ordenamento jurídico, não se concebe distinção também entre seres humanos em desenvolvimento na fase intrauterina, ainda que se comprovem anomalias ou malformações do feto; todos enquanto se desenvolvem no útero materno são protegidos, em sua vida e dignidade humana, pela Constituição e leis.

Trata-se de seres humanos que podem receber doações [art. 542 do Código Civil], figurar em disposições testamentárias [art.1.799 do Código Civil] e mesmo ser adotados [art. 1.621 do Código Civil]. É inconcebível, como afirmou Teixeira de Freitas ainda no século XIX, um de nossos mais renomados civilistas, que haja ente com suscetibilidade de adquirir direitos sem que haja pessoa. E, digo eu mesmo agora, nele inspirado, que se a doação feita ao nascituro valerá desde que aceita pelo seu representante legal tal como afirma o artigo 542 do Código Civil – é forçoso concluir que os nascituros já existem e são pessoas, pois “o nada não se representa”.

Queiram ou não os que fazem praça do aborto de anencéfalos, o fato é que a frustração da sua existência fora do útero materno, por ato do homem, é inadmissível [mais do que inadmissível, criminosa] no quadro do direito positivo brasileiro. É certo que, salvo os casos em que há, comprovadamente, morte intrauterina, o feto é um ser vivo.

Tanto é assim que nenhum, entre a hierarquia dos juízes de nossa terra, nenhum deles em tese negaria aplicação do disposto no artigo 123 do Código Penal [1], que tipifica o crime de infanticídio, à mulher que matasse, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho anencéfalo, durante o parto ou logo após, sujeitando a a pena de detenção, de dois a seis anos. Note-se bem que ao texto do tipo penal acrescentei unicamente o vocábulo anencéfalo!

Ora, se o filho anencéfalo morto pela mãe sob a influência do estado puerperal é ser vivo, por que não o seria o feto anencéfalo que repito pode receber doações, figurar em disposições testamentárias e mesmo ser adotado?

Que lógica é esta que toma como ser, que considera ser alguém – e não res – o anencéfalo vítima de infanticídio, mas atribuiao feto que lhe corresponde o caráter de coisa ou algo assim?

De mais a mais, a certeza do diagnóstico médico da anencefalia não é absoluta, de modo que a prevenção do erro, mesmo culposo, não será sempre possível. O que dizer, então, do erro doloso?

A quantas não chegaria, então, em seu dinamismo – se admitido o aborto – o “moinho satânico” de que falava Karl Polanyi?[2] A mim causa espanto a ideia de que se esteja a postular abortos, e com tanto de ênfase, sem interesse econômico determinado. O que me permite cogitar da eventualidade de, embora se aludindo à defesa de apregoados direitos da mulher, estar-se a pretender a migração, da prática do aborto, do universo da ilicitude penal, para o campo da exploração da atividade econômica. Em termos diretos e incisivos, para o mercado. Escrevi esta pequena nota para gritar, tão alto quanto possa, o direito de viver.

[1] “Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena – detenção de dois a seis anos.”
[2] A grande transformação: as origens da nossa época. Tradução portuguesa de Fanny Wrobel. 2. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000.

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Bons estudos!
Carla e Hendrio

terça-feira, 26 de julho de 2011

Coragem

Mensagem do Espírito André Luiz.


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Coragem também é caridade.

Hesitação do conhecimento — poder à ignorância.

Debilidade da retidão — apoio ao desequilíbrio.

Decisão firme — leme seguro.

Vontade frágil — barco à matroca.

Irresolução dos bons — garantia dos maus.

*

Nada se realiza de útil e grande sem a coragem.

Descobertas e inventos não se consolidariam nos fastos da civilização material, sem os sacrifícios daqueles que lhes hipotecaram a existência.

Harvey torturou-se até a morte, a fim de provar a circulação do sangue.

Jesus não foi mais feliz, procurando revelar a verdade...

Foto: Hendrio Belfort

Em Doutrina Espírita, sabemos o que seja o bem, como fazer o bem, quando praticar o bem e quanto nos cabe atender ao bem, de vez que nos achamos informados de que o maior bem para nós nasce, invariável, da obrigação nobremente cumprida de formar o bem para os outros.

Não vale pedir alheia orientação, se a orientação desse modo se nos estampa, luminosa, na consciência.

Esqueçamos os antigos chavões “não sei se vou” e “não sei se posso”, ante os deveres que as circunstâncias nos traçam. Timidez não é humildade.

Para que haja luz não bastará temer a presença da sombra. É preciso acendê-la.


~*~*~*~*~*~


Bons estudos!
Carla e Hendrio


XAVIER, Francisco Cândido e VIEIRA, Waldo. “Estude e Viva”. Pelos Espíritos Emmanuel e André Luiz. 6.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1965. Capítulo 20.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Crer para ver

“Bem-aventurados os que não viram e creram.” (João 20:29)

Expusemos, na postagem “A Fé”, que a ciência necessita de atos de fé para validar premissas matemáticas cuja consistência não pode ser provada. Para nos entendermos como parte da Criação; para concluirmos que, tal como o Universo, evoluímos indefinidamente, também necessitamos da mesma fé, baseada na lógica.

A hipótese de que somos apenas uma máquina eletroquímica, formada por átomos organizados ao acaso; e a ideia de que, quando nascemos, viemos do nada e, ao morrer nosso corpo, deixaremos completamente de existir, são crença fervorosa de quem temporariamente se identifica com o materialismo. Uma das razões expostas para defender essa visão de mundo é que Deus, Jesus ou os Espíritos não se materializam à sua frente para lhes “provar” que existem. Mas, é realmente isso o que devemos aguardar acontecer para passarmos a acreditar em uma Inteligência infinitamente sábia e benévola a transformar o caos do “Big Bang” no Universo perfeitamente organizado que a Ciência constata? Seria mesmo a aparição de um Espírito, ou um conjunto de “milagres”, o melhor requisito para deixarmos de ver lógica em o acaso ser o responsável por toda a ordem reinante no Universo e na formação de organismos complexos como o nosso corpo físico?

Precisamos de fé para entender que um mais um somam dois, para seguirmos adiante no entendimento da lógica matemática. Também precisamos de fé para entendermos que a vida encarnada não é uma só, pois jamais conseguiríamos aprender tudo que há de lições neste Planeta, mesmo sendo a pessoa mais sábia e longeva. E a fé nos permitirá também entender que Deus é infinitamente justo e bom; ama a todos nós, independente de nosso estado evolutivo, pois as Leis infinitamente perfeitas, criadas por Ele, nos impelem à evolução nos campos moral e intelectual, um processo constante e inevitável. Dessa forma, termos nascido e possuirmos desafios e dificuldades a enfrentar passam a fazer sentido: são etapas de aprendizado a superar, seguidas por mais lições para nossa infinita evolução.

Allan Kardec, o Codificador da Doutrina Espírita, propôs à Espiritualidade Superior um questionamento nesse sentido [1]:
“Visto que o Espiritismo tem que marcar um progresso da Humanidade, por que não apressam os Espíritos esse progresso, por meio de manifestações tão generalizadas e patentes, que a convicção penetre até nos mais incrédulos?”
O educador lionês obteve a seguinte resposta:
“Desejaríeis milagres; mas, Deus os espalha a mancheias diante dos vossos passos e, no entanto, ainda há homens que o negam. Conseguiu, porventura, o próprio Cristo convencer os seus contemporâneos, mediante os prodígios que operou? Não conheceis presentemente alguns que negam os fatos mais patentes, ocorridos às suas vistas? Não há os que dizem que não acreditariam, mesmo que vissem? Não; não é por meio de prodígios que Deus quer encaminhar os homens. Em sua bondade, ele lhes deixa o mérito de se convencerem pela razão.” [1]
Na obra “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, Kardec pondera nos seguintes termos:
“Alguns incrédulos se admiram de que os Espíritos tão poucos esforços façam para os convencer. A razão está em que estes últimos cuidam preferentemente dos que procuram, de boa-fé e com humildade, a luz, do que daqueles que se supõem na posse de toda a luz e imaginam, talvez, que Deus deveria dar-se por muito feliz em atraí-los a si, provando-lhes a sua existência.
(...) A esses não quer Deus abrir à força os olhos, dado que lhes apraz tê-los fechados.
(...) Perguntar-se-á: não poderia Deus tocá-los pessoalmente, por meio de manifestações retumbantes, diante das quais se inclinassem os mais obstinados incrédulos? É fora de toda dúvida que o poderia; mas, então, que mérito teriam eles e, ao demais, de que serviria? Não se veem todos os dias criaturas que não cedem nem à evidência, chegando até a dizer: “Ainda que eu visse, não acreditaria, porque sei que é impossível?” Esses, se se negam assim a reconhecer a verdade, é que ainda não trazem maduro o espírito para compreendê-la, nem o coração para senti-la. (...) Deus primeiramente corrige o orgulho. Ele não deixa ao abandono aqueles de seus filhos que se acham perdidos, porquanto sabe que cedo ou tarde os olhos se lhes abrirão. Quer, porém, que isso se dê de moto-próprio, quando, vencidos pelos tormentos da incredulidade, eles venham de si mesmos lançar-se-lhe nos braços e pedir-lhe perdão, quais filhos pródigos.” [2]

Foto: Carla Engel

Somos parte da Criação Divina. Essa constatação é motivo de grande alegria e elevação de nossa autoestima, e razão para, todos os dias de nossas vidas, agradecermos a Deus por essa dádiva. Crer que a existência de Deus nos rebaixa, por termos um Ser superior, é indício de o orgulho falar por nós; e o orgulho não é um bom conselheiro.


Leia, também, neste blog, as postagens “A Fé” e “Por que Deus criou a nós e o Universo?”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:

[1] KARDEC, Allan. “O Livro dos Espíritos”. 66ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Questão 802.
[2] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Capítulo VII (“Bem-Aventurados os Pobres de Espírito”), itens 9 e 10.


quinta-feira, 19 de maio de 2011

Refletindo sobre Deus

O evangelista Marcos relata uma ocasião em que um dos escribas se aproximou de Jesus e perguntou sobre qual o maior dos mandamentos. O Mestre então responde:
“Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de todas as tuas forças.” (Marcos 12:30)
Jesus, como veio dar cumprimento à lei (Mateus 05:17), não trouxe, no amar a Deus, mandamento novo, pois esse mandamento já estava escrito no Velho Testamento, no livro Deuteronômio. Lá, no entanto, o mandamento está simplificado, pois diz:
“Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de toda a tua força.” (Deuteronômio 06:05)
A diferença entre as duas citações é a passagem “de todo o teu entendimento”. Busquemos, então, atingir um melhor entendimento sobre Deus, nosso Pai.


O que é refletir sobre Deus?

Não é possível a nós, criaturas, definir precisamente Deus, o Criador. O que podemos, como Jesus nos recomendou, é, pouco a pouco, melhorar o nosso entendimento sobre Deus, a cada dia, a cada vivência, a cada estudo, se nós estivemos atentos, despertos e dispostos a isso. Essa compreensão sobre Deus está condicionada ao nosso aperfeiçoamento, ao nosso progresso, tanto moral quanto intelectual, pois até mesmo quando a Ciência consegue explicar uma lei que rege o Universo, vemos aí a inteligência de Deus que já previu todo o fenômeno, e nós estamos, através do trabalho, do nosso esforço, compreendendo um pouco mais a Inteligência que rege tudo. E isso falando apenas em termos materiais... e quanto às ciências da alma, do amor? Quanto a aprender... Por isso, preferimos utilizar o verbo refletir.

Quando procuramos no dicionário a definição do verbo refletir, encontramos [1]:
  • Como verbo transitivo indireto (verbo que precisa de complemento com preposição, como a palavra “sobre”), refletir significa pensar maduramente, meditar, reflexionar. Esse o sentido que pensamos inicialmente, refletir sobre Deus. No entanto, esse verbo ainda traz um outro significado:
  • Como verbo transitivo direto (verbo cujo complemento é sem preposição), percebemos que o termo traduz nossa evoluída atitude futura, o que Jesus, como nosso modelo, já conseguiu e veio nos ensinar, que é “refletir Deus”, ou seja, deixar ver; revelar, mostrar, traduzir, através de nós, todo amor de Deus.
Outra palavra que vamos utilizar nessa nossa reflexão sobre Deus é “conceito”, que, segundo o dicionário, quer dizer: “ação de formular uma ideia por meio de palavras; definição, caracterização. Pensamento, ideia, opinião”.

Assim, os nossos objetivos são, primeiramente, apresentar o conceito de Deus segundo a Doutrina Espírita, convidando à comparação desse conceito com aqueles que já construímos; e, em sequência, refletir sobre o efeito desses conceitos em nossa vida.


Conceitos de Deus ao longo da história da Humanidade

O homem primitivo, ainda muito ligado à vida material, pois tinha de sobreviver num mundo hostil, tinha consciência íntima de Deus e transportava esse sentimento para os fenômenos e coisas da natureza, adorando o Sol, a Lua, o Céu, o Trovão, os Bosques...

Consideremos a questão 06 de “O Livro dos Espíritos”. Kardec dirigiu aos Espíritos Superiores a seguinte questão:
“O sentimento íntimo que temos da existência de Deus não poderia ser fruto da educação, resultado de ideias adquiridas?” [2]
Ou seja, vemos que nós já temos um sentimento íntimo da existência de Deus. Muitos podem até não concordar com a existência de Deus como lhe é apresentado, como um velhinho de barbas compridas, por exemplo. Mas o sentimento de que existe algo superior, nós temos. Kardec questiona – será que nós temos esse sentimento porque fomos ensinados a isso? Os Espíritos Superiores responderam:
“Se assim fosse, por que existiria nos vossos selvagens esse sentimento?” [2]
É exatamente o que acontece com o homem primitivo. Ninguém ensinou o homem das cavernas a adorar os fenômenos da Natureza. Esse sentimento já estava presente nele, pois ele tinha a consciência íntima de Deus; porém, o seu desenvolvimento só comportava esse tipo de adoração às coisas materiais. Era o que ele via e vivenciava; não havia ainda condições para maiores abstrações do pensamento.

Kardec retoma essa pergunta, de um modo diferente, quando estuda as leis naturais, na parte terceira de “O Livro dos Espíritos”, a seção que trata das leis morais, no Capítulo II, sobre a Lei de adoração. Nesse capítulo, na questão 650, encontramos:
Origina-se de um sentimento inato a adoração, ou é fruto de ensino?
Sentimento inato, como o da existência de Deus. A consciência de sua fraqueza leva o homem a curvar-se diante daquele que o pode proteger.” [3]
Avançando na História, obsevamos que os povos da Antiguidade, como os sumérios, babilônios, assírios e caldeus, eram politeístas, ou seja, acreditavam na existência de vários deuses.

Os gregos também eram politeístas, e pela Mitologia, cada coisa tinha o seu Deus respectivo e cada Deus a sua tarefa e função definida, e com isso havia uma explicação sobre certos fenômenos da vida da Terra e do Universo. Os romanos adotaram deuses gregos como seus, apenas com a mudança dos nomes. Desta forma, tínhamos Zeus na Grécia, que ficou sendo Júpiter em Roma, e assim por diante.

Já os persas, através de Zoroastro, acreditavam na existência de dois poderes, o Bem e o Mal. Percebe-se um passo em direção à ideia monoteísta, ou seja, de um deus único, pois antes de Zoroastro, os persas também eram politeístas, como os demais povos.

Os egípcios tinham os seus deuses para o povo em geral, porém os sacerdotes cultuavam, em segredo, uma Inteligência Una, regente do Cosmo.

Os hebreus adoravam e cultuavam um Deus único, Jeová, Senhor dos Exércitos. No livro Êxodo, do Velho Testamento, no capítulo XX, quando começa o Decálogo, ou seja, os 10 mandamentos, vemos o primeiro mandamento que traduz a ideia de Deus daquele povo:
“Eu sou o Senhor, vosso Deus, que vos tirei do Egito, da casa da servidão. Não tereis diante de mim, outros deuses estrangeiros – Não fareis imagem esculpida, nem figura alguma do que está em cima no céu, nem em baixo, na Terra, nem do que quer que esteja nas águas sob a terra. Não os adorareis e não lhes prestareis culto soberano (...)”. (Êxodo 20:02-05)
Vemos, nesse trecho, uma abordagem diferente de tudo o que tínhamos antes como ideia de Deus. Não mais uma forma, qualquer que fosse, para o representá-lo; não mais vários deuses, mas um só Deus.

Continuando este breve relato histórico do conceito de Deus ao longo do tempo, temos o ponto máximo com Jesus, que mantém a ideia de Deus único, do povo hebreu, e estende esse entendimento para o Deus Pai.

Há várias passagens evangélicas em que Jesus se refere a Deus como Pai, mas destacamos a registrada por Mateus, em seu capítulo 6, versículos 09 a 13, bem como por Lucas, no capítulo 11, versículos 02 a 04, que é a prece do Pai Nosso, quando Jesus nos ensina a orar.

Outra passagem que destacamos é a que Jesus conversa com a mulher samaritana e diz, conforme o relato de João:
“Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem. Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e verdade.” (João 04:23-24)
É outro salto evolutivo: entender que não precisamos de nada material para adorar a Deus.

Finalizamos nossa viagem histórica abordando o conceito de Deus segundo a Doutrina Espírita [4], o qual não difere do conceito trazido por Jesus. Façamos um breve comparativo entre o conceito de Deus segundo Moisés e segundo Jesus:

Segundo Moisés Segundo Jesus
Deus único, Soberano Senhor e Orientador de todas as coisas Deus único, Pai
Terrível, ciumento Soberanamente justo e bom
Vingativo, cruel, implacável Imparcial
Rega a terra com sangue humano Deus que vê o pensamento e não se honra com a forma
Deus dos exércitos Deus de misericórdia
Deus único de um único povo privilegiado Pai comum de todo o gênero humano
Deus que quer ser temido Deus que quer ser amado

Resumindo esse apanhado histórico, o conceito de Deus começou relacionado a fenômenos da Natureza — muitos deuses; passou para a representação humana desses muitos deuses (como vemos com os gregos e romanos); com os hebreus, chegou ao entendimento de que Deus é único e não tem forma definida, mas ainda com sentimentos humanos (ficando com raiva e vingando-se); e Jesus nos traz o conceito de Deus único, imaterial e com sentimentos sublimes.

Foto: Hendrio Belfort


Qual o nosso entendimento sobre Deus?

Kardec, no estudo que faz na Gênese, ainda no capítulo I, Caráter da Revelação Espírita, conclui, dizendo:
“Toda a doutrina do Cristo se funda no caráter que ele atribui à Divindade. Com um Deus imparcial, soberanamente justo, bom e misericordioso, ele fez do amor de Deus e da caridade para com o próximo a condição indeclinável da salvação, dizendo: Amai a Deus sobre todas as coisas e o vosso próximo como a vós mesmos; nisto estão toda a lei e os profetas; não existe outra lei.” [4]
Se Jesus nos disse que devemos amar a Deus de todo o nosso entendimento, qual é o nosso entendimento de Deus, hoje? Meditemos a respeito; não é necessário comentar com ninguém, é algo só nosso, para que, de forma escrita ou no pensamento, possamos refletir qual é o nosso, pessoal e intransferível, entendimento sobre Deus.


O Consolador relembra e complementa os ensinos de Jesus sobre Deus

João registrou em seu Evangelho, que Jesus afirmou não ter podido trazer um conjunto completo de esclarecimentos:
“Tenho ainda muito que vos dizer, mas não o podeis suportar agora.” (João 16:12)

“Mais tarde, porém, enviar-vos-ei o Consolador, o Espírito de Verdade, que restabelecerá todas as coisas e vo-las explicará todas.” (João 14:16, 17 e 26)
Nós também estamos evoluindo ao longo do tempo. Coisas que na época de Jesus eram desconhecidas ou inexplicáveis, hoje a Ciência veio nos explicar e compreendemos e, principalmente, usufruímos. Da mesma forma, o ensino de Jesus, como Ele mesmo previu, seria deturpado, se afastaria da pureza inicial, e deveria ser restabelecido. E, entre esses ensinos, o próprio entendimento de Deus.

E qual é o Consolador Prometido? O Espiritismo.
“O Espiritismo, partindo das próprias palavras do Cristo, como este partiu das de Moisés, é consequência direta da sua doutrina. (...) Pelo Espiritismo, o homem sabe donde vem, para onde vai, por que está na Terra, por que sofre temporariamente e vê por toda parte a justiça de Deus.(...)” [5]
A partir desse entendimento, como Kardec estruturou todo o conhecimento que obteve através dos questionamentos aos Espíritos e o estudo de suas respostas? Qual foi a base?

Observemos que, no primeiro livro da Codificação Espírita – “O Livro dos Espíritos”, na 1ª Parte – Das causas primárias, primeiro capítulo – De Deus, a primeira pergunta dirigida aos Espíritos Superiores é:
“Que é Deus?” [6]
Por que essa preocupação em começar com o entendimento acerca de Deus? Porque, a partir desse entendimento, se desenvolvem toda a filosofia e toda a religião. Aqueles que não entenderam Deus como o ser onipotente, ou seja, com todo o poder, tiveram que imaginar muitos deuses. Aqueles que não entenderam Deus como a suprema bondade e justiça, tiveram de imaginar um Deus colérico, parcial, vingativo. E, principalmente, porque, de acordo com a ideia que fazemos de Deus, pautamos a nossa vida.

Kardec demonstra, assim, que o Espiritismo tem na existência de Deus o seu primeiro princípio basilar.

A primeira pergunta de Kardec já traz um entendimento importante: Deus não é uma pessoa, pois, caso contrário, Kardec teria perguntado quem é Deus. Interessante notar que Kardec não perguntou “Quem é Deus?”, pois se assim fizesse, já estaria induzindo uma resposta, estaria dando um sentido de personificação, uma ideia antropomórfica, ou seja, estaria imaginando Deus com a figura de um homem, velho ou jovem. Ao longo do tempo, nós trouxemos Deus até a nossa pequenez, demos-lhe até a forma humana... Mas com Moisés e Jesus já temos o entendimento de que somos nós que devemos nos esforçar para subir até Ele — nós é que precisamos nos aproximar de Deus, e não humanizar Deus.

Também Kardec não perguntou “O que é Deus?”, regido por artigo, porque aí estaria “coisificando” Deus, já que o artigo definido masculino singular é utilizado para definir coisas. Até a pergunta tem a sua ciência, e fica o convite de, sempre que possível, em nossos estudos, prestarmos atenção não só à resposta, mas também à pergunta que Allan Kardec elaborou, pacientemente, com sabedoria, para obter a resposta mais completa, mais alinhada com o que ele queria realmente saber. “Que é Deus” deixa aos Espíritos a liberdade de responderem sem induções, sem ideias pré-concebidas.

Abrindo “O Livro dos Espíritos”, então, à primeira questão, os Espíritos Superiores responderam, em síntese brilhante:
“Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas.” [6]
Sendo Causa Primária, é o criador de tudo. E sendo a Inteligência Suprema, nossa inteligência, ainda não desenvolvida, não tem condições de alcançá-Lo e entendê-Lo em plenitude.

Kardec continua:
“Poder-se-ia dizer que Deus é o infinito?” [7]
Lembremos que o infinito tem relação com aquilo que desconhecemos. É como se inventássemos uma palavra nova, uma palavra que não tem sentido para nós porque não conhecemos, e quiséssemos dizer que Deus é esta palavra. Não estaríamos esclarecendo nada, porque desconhecemos o sentido do novo termo. Assim também os Espíritos respondem, à questão 02 de “O Livro dos Espíritos”, que dizer que Deus é o infinito é uma pobreza de linguagem humana, uma definição insuficiente, incompleta, que não consegue definir o que está acima da linguagem humana.

Kardec apresenta um comentário a essa resposta. Ele diz:
“Deus é infinito em suas perfeições, mas o infinito é uma abstração. Dizer que Deus é o infinito é tomar o atributo de uma coisa pela coisa mesma, é definir uma coisa que não está conhecida por uma outra que não o está mais do que a primeira.” [7]
Deus é o máximo em tudo que podemos imaginar. Mas não podemos dizer que Ele é o infinito; seria tomar o atributo, a qualidade, pela coisa mesma. Assim, ser infinito é uma das qualidades ou atributos de Deus e não podemos definir “algo” por seus atributos.

Acompanhemos mais algumas questões sobre Deus:
Pode o homem compreender a natureza íntima de Deus?
Não; falta-lhe para isso o sentido.”

Será dado um dia ao homem compreender o mistério da Divindade?
Quando não mais tiver o espírito obscurecido pela matéria. Quando, pela sua perfeição, se houver aproximado de Deus, ele o verá e compreenderá.” [8]
Para compreender a Deus plenamente, falta-nos o sentido, que só poderá ser adquirido por meio da completa depuração do Espírito, ou seja, quando formos evoluídos.

Então isso significa que nosso entendimento de Deus deve ser nulo? Definitivamente não deve ser assim, daí o nosso esforço para, dentro das nossas possibilidades, formar a ideia mais clara e mais verdadeira de Deus. Essa foi a mesma preocupação de Kardec, quando perguntou:

Embora não possamos compreender a natureza íntima de Deus, podemos formar ideia de algumas de suas perfeições?
De algumas, sim. O homem as compreende melhor à proporção que se eleva acima da matéria. Entrevê-as pelo pensamento.”

Quando dizemos que Deus é eterno, infinito, imutável, imaterial, único, onipotente, soberanamente justo e bom, temos ideia completa de seus atributos?
Do vosso ponto de vista, sim, porque credes abranger tudo. Sabei, porém, que há coisas que estão acima da inteligência do homem mais inteligente, as quais a vossa linguagem, restrita às vossas ideias e sensações, não tem meios de exprimir. A razão, com efeito, vos diz que Deus deve possuir em grau supremo essas perfeições, porquanto, se uma lhe faltasse, ou não fosse infinita, já ele não seria superior a tudo, não seria, por conseguinte, Deus. Para estar acima de todas as coisas, Deus tem que se achar isento de qualquer vicissitude e de qualquer das imperfeições que a imaginação possa conceber.” [9]

Deus é:
  • A suprema e soberana inteligência – a inteligência do homem é limitada, pois não pode compreender tudo o que existe. A de Deus, tem de ser infinita.
  • Eterno – sem começo e sem fim.
  • Imutável – se estivesse sujeito a mudanças, as leis que regem o Universo nenhuma estabilidade teriam.
  • Imaterial – sua natureza difere de tudo o que chamamos de matéria. Se fosse material, não seria imutável.
  • Único – se muitos deuses houvesse, não haveria unidade no Universo.
  • Onipotente – se não possuísse o poder supremo, sempre se poderia conceber um ser mais poderoso, até o fim da escala. Esse ser seria Deus.
  • Soberanamente justo e bom – a sabedoria das leis divinas se revela em tudo, nas pequenas e nas grandes coisas.
  • Infinitamente perfeito – é impossível conceber-se Deus sem o infinito das perfeições, sem o que sempre se poderia conceber um ser que possuísse o que lhe faltasse.

“As descobertas que a Ciência realiza, longe de o rebaixarem, glorificam a Deus; unicamente destroem o que os homens edificaram sobre as falsas ideias que formaram de Deus.” [10]


Refletir sobre Deus...

Tomemos um ou mais dos atributos de Deus, listados acima, e pensemos, com nossas próprias palavras, ideias e valores, em sua importância para nossas vidas. Alguns exemplos:

  • Quando penso na imutabilidade de Deus, considero que suas leis também são imutáveis e que sou eu que devo esforçar-me por compreendê-las e cumpri-las. Quem precisa se transformar sou eu. A imutabilidade de Deus é um ponto de segurança em meio a mutabilidade de tudo na vida.
    Como Deus é imutável, eu transformo-me, aprimoro-me, para aproximar-me cada vez mais de Deus.
  • Quando penso que Deus é soberanamente justo e bom, considero que tudo o que ocorre é para meu aprimoramento, mesmo o que nos parece negativo neste momento. Tudo são lições para sermos melhores.
    Como Deus é soberanamente justo e bom, eu preciso desenvolver minha fé para sentir-me amparada(o) em todos os momentos.


Que Jesus continue protegendo-nos e fortalecendo-nos para, cada vez com mais decisão e coragem, seguirmos o caminho que nos levará a Deus.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:

[1] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. “Novo Aurélio Século XXI”, 1999, verbetes Refletir e Conceito.
[2] KARDEC, Allan. “O Livro dos Espíritos”. 66ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Questão 06.
[3] Ibidem. Questão 650.
[4] KARDEC, Allan. “A Gênese”. 34.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Capítulo I (“Caráter da Revelação Espírita”), itens 21 a 25.
[5] Ibidem, item 30.
[6] KARDEC, Allan. “O Livro dos Espíritos”. 66ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Questão 01.
[7] Ibidem. Questão 03.
[8] Ibidem. Questões 10 e 11.
[9] Ibidem. Questões 12 e 13.
[10] KARDEC, Allan. “A Gênese”. 34.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Capítulo I (“Caráter da Revelação Espírita”), item 55.


segunda-feira, 25 de abril de 2011

Os Sábios Reais

Mensagem de Emmanuel, para nossa reflexão...


“Quem dentre vós é sábio e entendido mostre por seu bom trato as suas obras em mansidão de sabedoria.” (Tiago, 3:13)

Milhares de pessoas senhoreiam os tesouros da instrução, multiplicando títulos, no campo social, para fugirem, incompreensivelmente, do trabalho e da fraternidade.

Aqui temos um bacharel que, por haver conquistado um diploma profissional, declara-se incapaz de efetuar a limpeza da própria roupa, quando necessário; ali vemos uma jovem musicista que, por haver atravessado os salões de um conservatório, afirma-se inabilitada para servir as refeições no próprio lar. Além, observamos um negociante inteligente que, por haver explorado a confiança alheia, recolhe-se nos castelos da finança segura, asseverando-se entediado do contato com a multidão, que lhe conferiu a prosperidade. Mais adiante notamos religiosos de vários matizes que, depois de se declararem consolados e esclarecidos pela fé, começam a ironizar os irmãos infelizes ou ignorantes que, em nome de Deus, lhes aguardam os testemunhos de bondade e de amor.

Foto: Carla Engel

Na vida espiritual, todavia, os verdadeiros sábios são conhecidos por ângulos diferentes.

Os verdadeiros amigos da luz revelam-se através da generosidade pessoal. Sabem que o isolamento é orgulho, que a violência é crueldade, que a exigência descabida é serviço da treva, que o sarcasmo é perturbação... Reconhecem que a sabedoria é paternidade espiritual, cheia de compreensão e carinho, e, por isso, sem qualquer humilhação a ninguém, auxiliam a todos, indistintamente, acendendo, com amor, na escura ignorância que os cercam, a luz abençoada que brilhará, vitoriosa, amanhã.



XAVIER, Francisco Cândido. “Segue-Me!...”. Pelo Espírito Emmanuel. 7.ed. Matão, SP: Casa Editora o Clarim, 1994. “Os Sábios Reais”.


segunda-feira, 18 de abril de 2011

154 anos do Consolador Prometido

Em 18 de abril de 1857, o mundo tomou contato com o Consolador prometido por Jesus.

Participemos de um dia na vida de Allan Kardec, o Codificador da Doutrina Espírita, através da história narrada pelo Espírito Hilário Silva [1] e dividida em três partes. A cada trecho, analisemos o que podemos apreender sobre a história do Espiritismo.
“I

Allan Kardec, o Codificador da Doutrina Espírita, naquela triste manhã de abril de 1860, estava exausto, acabrunhado.
Fazia frio.
Muito embora a consolidação da Sociedade Espírita de Paris e a promissora venda de livros, escasseava o dinheiro para a obra gigantesca que os Espíritos Superiores lhe haviam colocado nas mãos.
A pressão aumentava...
Missivas sarcásticas avolumavam-se à mesa.
Quando mais desalentado se mostrava, chega a paciente esposa, Madame Rivail — a doce Gaby —, a entregar-lhe certa encomenda, cuidadosamente apresentada.”

Allan Kardec foi o pseudônimo adotado pelo professor Hippolyte Léon Denizard Rivail para diferenciar a obra que se iniciava — a Doutrina Espírita — de seus demais livros já publicados sobre educação. Como surgiu a Doutrina Espírita, o Consolador Prometido?

Vamos retroceder alguns anos antes daquele da narrativa de Hilário Silva: França, 1854.

O professor Rivail, como todos na Europa, também ouve falar do fenômeno das mesas girantes (que consistiam em pessoas sentarem-se ao redor de uma mesa e, após algum tempo, a mesa movimentar-se — geralmente eram mesas redondas que giravam), através de um amigo chamado Fortier.

É no livro Obras Póstumas [2] que Kardec relata como foi esse primeiro contato com o fenômeno.

O Sr. Fortier, o qual, como o próprio professor Rivail, era estudioso do Magnetismo, disse-lhe:
“Já sabe da singular propriedade que se acaba de descobrir no Magnetismo? Parece que já não são somente as pessoas que se podem magnetizar, mas também as mesas, conseguindo-se que elas girem e caminhem à vontade.”
Rivail responde: — “É, com efeito, muito singular; mas, a rigor, isso não me parece radicalmente impossível. O fluido magnético, que é uma espécie de eletricidade, pode perfeitamente atuar sobre os corpos inertes e fazer que eles se movam.”
Algum tempo depois, Rivail encontra-se novamente com o Sr. Fortier, que disse:
“— Temos uma coisa muito mais extraordinária; não só se consegue que uma mesa se mova, magnetizando-a, como também que fale. Interrogada, ela responde.
E Rivail considera: “ — Isto agora é outra questão. Só acreditarei quando o vir e quando me provarem que uma mesa tem cérebro para pensar, nervos para sentir e que possa tornar-se sonâmbula. Até lá, permita que eu não veja no caso mais do que um conto para fazer-nos dormir em pé.”
Em 1855, o Prof. Rivail encontrou-se com Sr. Carlotti, também seu amigo, que falou daqueles fenômenos durante cerca de uma hora, com muito entusiasmo. Foi o primeiro que falou na intervenção dos Espíritos e contou tantas coisas surpreendentes que, longe de convencer, aumentaram as dúvidas do professor Rivail.

Em maio de 1855, o professor Rivail encontrou-se com o Sr. Pâtier, que lhe falou dos mesmos fenômenos que o Sr. Carlotti tinha se pronunciado, mas em tom muito diverso, já que o Sr. Pâtier era já de certa idade, muito instruído, de caráter grave, frio e calmo. Sua linguagem pausada, isenta de todo entusiasmo, produziu no Prof. Rivail viva impressão. Nessa ocasião, o professor Rivail foi convidado a assistir às experiências que se realizavam em casa da Sra. Plainemaison, e ele aceitou.

Ele descreve em suas memórias:
“Foi aí que, pela primeira vez, presenciei o fenômeno das mesas que giravam, saltavam e corriam, em condições tais que não deixavam lugar para qualquer dúvida. Eu entrevia, naquelas aparentes futilidades, no passatempo que faziam daqueles fenômenos, qualquer coisa de sério, como que a revelação de uma nova lei, que tomei a mim estudar a fundo.”
A princípio, Rivail objetivava apenas sua própria instrução. E como Rivail estudava? Observemos como ele nos descreve:
“Levava para cada sessão uma série de questões preparadas e metodicamente dispostas. (...)”
Fica a pergunta para nós, em todas as áreas do conhecimento, não só no estudo do Espiritismo: será que levamos tão a sério um estudo, a ponto de comparecermos a uma reunião já com o tema estudado e com questões previamente formuladas, de modo a realmente nos instruirmos, aprendermos? Se ainda não fazemos, fica a sugestão, não nossa, mas do próprio Codificador...

Ele complementa que:
“Eu, a princípio, cuidara apenas de instruir-me; mais tarde, quando vi que aquilo constituía um todo e ganhava as proporções de uma doutrina, tive a ideia de publicar os ensinos recebidos, para instrução de toda a gente. Foram aquelas mesmas questões que, sucessivamente desenvolvidas e completadas, constituíram a base de O Livro dos Espíritos.”
Por que chamamos Kardec de O Codificador do Espiritismo?
Codificar significa reunir em código (reunir as leis de modo ordenado). O Codificador é aquele que faz a codificação, ou seja, essa reunião em código.
E o que o Prof. Rivail fez? Exatamente isso:
  • Nunca formulou teorias pré-concebidas;
  • Observou atentamente;
  • Comparou;
  • Deduziu as consequências;
  • Procurou sempre a razão e a lógica dos fatos;
  • Interrogou os Espíritos, anotou e ordenou os dados que obteve.
Por isso é chamado Codificador do Espiritismo.

A Codificação Espírita está representada nas 5 obras publicadas por Allan Kardec, que são:
  • 1857 – O Livro dos Espíritos;
  • 1861 – O Livro dos Médiuns (desenvolvimento da 2ª parte de O Livro dos Espíritos – a parte experimental);
  • 1864 – O Evangelho Segundo o Espiritismo (desenvolvimento da 3ª parte de O Livro dos Espíritos — As Leis Morais);
  • 1865 – O Céu e o Inferno (desenvolvimento da 4ª parte de O Livro dos Espíritos — Das penas e gozos presentes e futuros);
  • 1868 – A Gênese (desenvolvimento da 1ª parte de O Livro dos Espíritos — das Causas Primárias — e explicação sobre os milagres e as predições).
Lembramos, também, outras obras que devem ser consultadas e estudadas por quem se interessa pela Doutrina Espírita, que são:
  • 1858 – Revista Espírita, publicação mensal que continuou dirigida por Kardec até sua desencarnação, em 1869;
  • 1859 – O Que É o Espiritismo (recomendado pelo próprio Codificador para iniciar o estudo do Espiritismo, antes mesmo da leitura de O Livro dos Espíritos, conforme sua orientação em O Livro dos Médiuns, Primeira Parte. Cap. III – Do Método, item 35) — Contém sumária exposição dos princípios da Doutrina Espírita e as respostas às principais questões ou objeções que os novatos se sentem naturalmente propensos a fazer.
Continuando a nossa história...
“II

O professor abriu o embrulho, encontrando uma carta singela. E leu:
‘Sr. Allan Kardec:
Respeitoso abraço.
Com a minha gratidão, remeto-lhe o livro anexo, bem como a sua história, rogando-lhe, antes de tudo, prosseguir em suas tarefas de esclarecimento da Humanidade, pois tenho fortes razões para isso.
(...) Há cerca de dois anos casei-me com aquela que se revelou minha companheira ideal. (...) no início deste ano, de modo inesperado, minha Antoinette partiu desta vida, levada por sorrateira moléstia.
(...) Sem confiança em Deus, sentindo as necessidades do homem do mundo e vivendo com as dúvidas aflitivas de nosso século, resolvera seguir o caminho de tantos outros, ante a fatalidade...
(...) Namorara diversas vezes o [rio] Sena e acabei planeando o suicídio. ‘Seria fácil, não sei nadar’ — pensava.
Sucediam-se noites de insônia e dias de angústia. Em madrugada fria, quando as preocupações e o desânimo me dominaram mais fortemente, busquei a Ponte Marie.
Olhei em torno, contemplando a corrente... E, ao fixar a mão direita para atirar-me, toquei um objeto algo molhado que se deslocou da amurada, caindo-me aos pés.
Surpreendido, distingui um livro que o orvalho umedecera.
Tomei o volume nas mãos e, procurando a luz mortiça de poste vizinho, pude ler, logo no frontispício, entre irritado e curioso:
‘Esta obra salvou-me a vida. Leia-a com atenção e tenha bom proveito. – A. Laurent.’
Estupefato, li a obra — ‘O Livro dos Espíritos’ — ao qual acrescentei breve mensagem, volume esse que passo às suas mãos abnegadas, autorizando o distinto amigo a fazer dele o que lhe aprouver.”
Ainda constavam da mensagem agradecimentos finais, a assinatura, a data e o endereço do remetente.
O Codificador desempacotou, então, um exemplar de ‘O Livro dos Espíritos’ ricamente encadernado, em cuja capa viu as iniciais do seu pseudônimo e na página do frontispício, levemente manchada, leu com emoção não somente a observação a que o missivista se referira, mas também outra, em letra firme:
‘Salvou-me também. Deus abençoe as almas que cooperaram em sua publicação. — Joseph Perrier.’”

A segunda parte da narrativa de Hilário Silva aponta o severo impacto psicológico que a chamada “perda” de um ente querido, no caso a esposa do autor da carta, lhe trouxe, a ponto de pensar em desistir de viver.

Neste aspecto, a Doutrina Espírita traz preciosa contribuição. As Leis Divinas que o Espiritismo nos convida a estudar, apreender e perceber, nos mostra que a vida continua, bem como também continuam nossos laços de afeto com aqueles que amamos. Conforme nos orienta o Codificador em seus comentários à questão 936 de “O Livro dos Espíritos” [4]:
“Pelas provas patentes, que ministra, da vida futura, da presença, em torno de nós, daqueles a quem amamos, da continuidade da afeição e da solicitude que nos dispensavam; pelas relações que nos faculta manter com eles, a Doutrina Espírita nos oferece suprema consolação, por ocasião de uma das mais legítimas dores.
Com o Espiritismo, não mais solidão, não mais abandono: o homem, por muito insulado que esteja, tem sempre perto de si amigos com quem pode comunicar-se.”
O Espiritismo não nos ensina a sermos indiferentes à morte, insensíveis à desencarnação de quem amamos. Como lemos acima, o próprio Codificador a considera uma legítima dor. O que a Doutrina Espírita nos ensina é que, juntamente à dor, não podemos nutrir o desespero, a revolta, sentimentos de vingança e outras vibrações inferiores e deprimentes.

A esse respeito, o notável Francisco Cândido Xavier, na entrevista que concedeu ao programa “Pinga Fogo” de 28 de julho de 1971, também traz importantes esclarecimentos. Uma telespectadora do programa, por telefone, lhe endereçou o seguinte questionamento: “Perdi um filho há um ano. Choro muito. Quero saber se as minhas lágrimas estão prejudicando meu filho.” O apóstolo da mediunidade assim respondeu:
“Quando as lágrimas nascem do nosso reconhecimento a Deus pelos benefícios que recebemos; quando as lágrimas refletem a nossa saudade tocada de esperança, os nossos amigos desencarnados nos dizem que as lágrimas fazem a eles muito bem, porque elas são luzes no caminho daqueles que são lembrados com imenso carinho.
Mas quando as nossas lágrimas traduzem revolta de nossa parte diante dos Desígnios Divinos, que nós não podemos de imediato sondar; quando essas lágrimas retratam rebeldia, essas lágrimas prejudicam os desencarnados, tanto quanto prejudicam os encarnados também.”
Chico Xavier nos aconselha, em sua ponderação, a, quando nos chegar a dor da saudade de um amigo ou ente querido, seja encarnado e em viagem a trabalho para localidade distante, seja desencarnado e, portanto, também em viagem de volta à Pátria Espiritual e também sempre convidado a trabalhar em prol do Bem de seu próximo e de si mesmo, utilizemos nossa energia destinando a essa pessoa bons pensamentos. Desejemos que ela esteja bem, com saúde, feliz, cercada de bons amigos, aprendendo e se desenvolvendo sempre mais.

Através do Fluido Universal, nossos pensamentos podem chegar às pessoas que amamos; e os pensamentos de nossos entes queridos também podem chegar a nós. Para melhor os percebermos, mantenhamo-nos em Paz, atentos às oportunidades diárias de fazer o Bem, e nos sintonizaremos em vibração mais elevada, sentindo, assim, ondas de alegria e bem-estar chegando a nós, certamente enviadas por amigos, encarnados e desencarnados, que nos queiram bem. Façamos também esse mesmo Bem a eles; todos temos condições de fazê-lo.

Hilário Silva também fala a respeito da vontade que duas pessoas tinham de abreviar seu tempo de reencarnação, felizmente dissuadidas da ideia após lerem “O Livro dos Espíritos”. As Leis Divinas, estudadas pela Doutrina Espírita, nos demonstram que a vida continua após a morte do corpo físico. Ideias suicidas, usualmente, têm relação com a tentativa radical de acabar com uma dificuldade. Porém, se continuamos vivos, também continua vivo o desafio a superar; mais cedo ou mais tarde, nos depararemos novamente com a mesma lição, até que a aprendamos e superemos. Por isso, o Espiritismo nos ensina a inutilidade de buscar abreviar nosso tempo de reencarnação.

Nas palavras de Allan Kardec, comentando a questão 957 de “O Livro dos Espíritos” [4]:
“A religião, a moral, todas as filosofias condenam o suicídio como contrário às leis da Natureza. (...) Por que não é livre o homem de pôr termo aos seus sofrimentos?
Ao Espiritismo estava reservado demonstrar, pelo exemplo dos que sucumbiram, que o suicídio não é uma falta, somente por constituir infração de uma lei moral, consideração de pouco peso para certos indivíduos, mas também (...) que nada ganha quem o pratica, antes o contrário é o que se dá, como no-lo ensinam, não a teoria, porém os fatos que ele nos põe sob as vistas.”
O Espiritismo não traz um discurso moralista sobre o suicídio. Ele demonstra, por suas leis, que atentar contra a própria vida não nos afasta de nossas dificuldades. A Doutrina Espírita vai além, apresentando relatos de quem buscou essa fuga e comprovou o que a Doutrina ensina nas leis que abrange. A obra “O Céu e o Inferno”, em sua segunda parte, capítulo V, apresenta diversos relatos de suicidas e as surpresas e decepções que encontraram após seu gesto para abreviar sua vida encarnada.

Não é suicídio apenas o gesto radical contra a própria vida. Os vícios, tanto em substâncias químicas — lícitas ou não — como em emoções deprimentes (tristeza, revolta, reclamações, ira etc.), nos retiram energia vital, e são vistos como abreviação de nosso tempo de vida reencarnada. Lemos, à questão 952 de “O Livro dos Espíritos” [4]:
Comete suicídio o homem que perece vítima de paixões que ele sabia lhe haviam de apressar o fim, porém a que já não podia resistir, por havê-las o hábito mudado em verdadeiras necessidades físicas?
É um suicídio moral. (...) Há nele então falta de coragem (...), [além do] esquecimento de Deus.”
Esse raciocínio é ilustrado na obra “No Mundo Maior” [6], de André Luiz:
“Temos neste domínio um gênero de suicídio habilmente dissimulado, a autoeliminação da harmonia mental, pela inconformação da alma nos quadros de luta que a existência humana apresenta.”
Acompanhemos a terceira e última parte da narrativa de Hilário Silva...
“III

Após a leitura da carta providencial, o Professor Rivail experimentou nova luz a banhá-lo por dentro...
Conchegando o livro ao peito, raciocinava, não mais em termos de desânimo ou sofrimento, mas sim na pauta de radiosa esperança.
Era preciso continuar, desculpar as injúrias, abraçar o sacrifício e desconhecer as pedradas...
Diante de seu espírito turbilhonava o mundo necessitado de renovação e consolo.
Allan Kardec levantou-se da velha poltrona, abriu a janela à sua frente, contemplando a via pública, onde passavam operários e mulheres do povo, crianças e velhinhos...
O notável obreiro da Grande Revelação respirou a longos haustos e, antes de retomar a caneta para o serviço costumeiro, levou o lenço aos olhos e limpou uma lágrima...

HILÁRIO SILVA”


Dessa belíssima narrativa de Hilário Silva, do livro “O Espírito da Verdade” [1], podemos retirar muitos ensinamentos...

Focalizando nossa atenção, agora, na figura do Codificador, e todas as dificuldades enfrentadas por ele, verificamos que, não é porque nos dedicamos ao bem que estamos isentos ou imunes às dificuldades da vida. Elas ocorrem.

Ele mesmo nos narra, já desencarnado, através de um médium, conforme publicado na Revista Espírita de dezembro de 1869 [3], ou seja, 9 meses após a sua desencarnação, que ocorreu em 31 de março daquele mesmo ano, o seguinte:
“Eu sabia, ao consagrar-me à obra de minha predileção, que me expunha ao ódio, à inveja e ao ciúme dos outros. O caminho se achava inçado de dificuldades que de contínuo se renovavam. Nada podendo contra a doutrina, atiravam-se ao homem; mas, por esse lado, eu me sentia forte, porque renunciara à minha personalidade.
Que me importavam os esforços da calúnia; a minha consciência e a grandeza do objetivo me faziam esquecer de boa vontade as urzes e os espinhos da estrada.”
Às vezes podemos achar que o caminho dos missionários é privilegiado, que não há dificuldades a vencer... Como vemos, não é bem assim. Porém, a esperança e a satisfação pelo dever cumprido, essa noção do dever que Kardec apresentou encarnado, o fizeram seguir adiante e possibilitaram que nós hoje, pudéssemos estudar essa Doutrina de Luz!

Outro ensinamento que se nos apresenta da narrativa de Hilário Silva é em relação a nossa ação no bem. Como vimos, o missivista não tinha qualquer obrigação de escrever para Kardec, encadernar o livro... Mas o fez e de uma forma tão delicada! Foi uma gentileza de sua alma grata. Um gesto de bondade. Surge para nós a pergunta: qual deve ser o nosso empenho no bem? Kardec propôs questão semelhante aos Espíritos Superiores, que está registrada em “O Livro dos Espíritos” [4], questão 642:
Para agradar a Deus e assegurar a sua posição futura, bastará que o homem não pratique o mal?
Não; cumpre-lhe fazer o bem no limite de suas forças, porquanto responderá por todo mal que haja resultado de não haver praticado o bem.”
O Espiritismo traz a proposta da Doutrina do Cristo, da renovação interior, do esforço para melhoria... Cabe perguntarmo-nos intimamente: estamos nos esforçando para fazer o bem, ou só não estamos praticando o mal? Estamos realmente aproveitando as oportunides de semear o bem que a vida nos oferece? Fazendo mais do que nossa simples obrigação?

É ainda o Espírito Emmanuel, no livro “Vinha de Luz” [5], que nos diz que:
“A caridade jamais se acaba.
O bem que praticares, em algum lugar, é teu advogado em toda parte.
Através do amor que nos eleva, o mundo se aprimora.”
Nós não temos noção do alcance de um bom gesto nosso. Kardec também, como vimos nessa narrativa, viu seu esforço servir para 2 seres humanos desistirem da ideia de suicídio e prosseguirem na vida, com mais coragem e resignação.

Podemos avaliar por nós... às vezes, um simples sorriso já ilumina nosso dia e nos ajuda a enfrentar com mais ânimo as dificuldades naturais do cotidiano. Um pequeno gesto de gentileza, uma palavra amiga... que bem nos faz!

E porque não sermos nós aqueles que fazem esse bem, pequenino bem que passa a ser nosso advogado em toda a parte.

E todo o mundo se eleva, todos saem ganhando, ajudamos a despoluir espiritualmente o planeta... Fazer o bem é uma atitude ecológica!


O Consolador Prometido por Jesus

O dicionário nos diz que consolar significa “aliviar ou suavizar a aflição, o sofrimento, o padecimento de.” Porém, o estudo da origem da palavra nos traz reflexões mais profundas sobre seu alcance.

Consolar, em sua origem, é a união de duas palavras do latim: cum + solis; ou seja, com + sol. O Sol é nossa referência de luz, calor e energia vitalizante. Assim, consolar é levar luz e calor ao coração; fazer com que as “tempestades” das provas da vida sejam suavizadas pela Luz e Calor norteadas por valores nobres, elevados, ou seja, da Espiritualidade Superior.

Jesus fala sobre o Consolador, conforme relata João, no capítulo 14, versículos 15 a 17 e 26 de seu evangelho:
“Se me amardes, guardareis os meus mandamentos.
E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre,
o Espírito de verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê, nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita convosco e estará em vós.
Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito.”
Jesus, o Espírito mais puro (ou seja, ungido; ou, em grego, Christós) que já esteve na Terra, sabia que não poderia trazer um conjunto muito amplo de conhecimentos; e já antevia que parte de seus ensinos sofreria distorções devido a interesses humanos. Por isso, o Consolador, o Espírito de Verdade, teria a dupla função de resgatar o Cristianismo em sua pureza original, bem como ampliar nossos conhecimentos.
“Muitas das coisas que vos digo ainda não as compreendeis e muitas outras teria a dizer, que não compreenderíeis.” (João 16:12)
Kardec não tinha mediunidade ostensiva. Ele fazia seus questionamentos e um médium escrevente transmitia as respostas. Como lemos em “Obras Póstumas” [7], o Espírito que liderava as inteligências que trariam o corpo da Doutrina Espírita se denominou, para Kardec, “A Verdade”, e se dispôs a auxiliar o Codificador apenas 15 minutos por mês, o que ocorreu por um curto período, para Kardec não recorrer a ele à menor dificuldade [7]. Vemos que, mesmo Espíritos com grandes missões em suas mãos, não podem esperar que a ajuda, literalmente, caia do céu, pois não cairá.

Em “O Evangelho Segundo o Espiritismo” [8], Kardec pondera:
“O Espiritismo vem, na época predita, cumprir a promessa do Cristo: preside ao seu advento o Espírito de Verdade. (...) o Espiritismo realiza o que Jesus disse do Consolador prometido: conhecimento das coisas, fazendo que o homem saiba donde vem, para onde vai e por que está na Terra; atrai para os verdadeiros princípios da lei de Deus e consola pela fé e pela esperança.”
Portanto, não por uma estimativa sua, mas pela análise criteriosa de milhares de mensagens, recebidas por via mediúnica em diversos lugares do mundo, apontando concordância entre os ensinos e a abrangência do estudo das mesmas Leis Divinas, Kardec conclui que a Doutrina Espírita é o Consolador prometido por Jesus, e que nos brinda com seus brilhantes ensinos há 154 anos.


Kardec: exemplo, e não ídolo

Os diversos missionários com que Deus nos presenteia, desde os mais conhecidos (Francisco de Assis; Zilda Arns; Mohandas Gandhi, Francisco Cândido Xavier e tantos outros), até os anônimos da mídia, mas que salvam milhões de vidas todos os anos, não podem servir para os colocarmos em um pedestal, distante de nós, e pensarmos que eles fizeram tanto porque são privilegiados, protegidos dos céus. Jesus, o melhor dos melhores exemplos, nos deixou a orientação de que devemos seguir seus passos, visando a evoluir tanto quanto ele mesmo, como lemos nas passagens a seguir:
“Eu disse: Vós sois deuses; E todos vós, filhos do Altíssimo.” (Salmos 82:06)

“Não está escrito na vossa Lei: Eu disse que vós sois deuses?” (João 10:34)

“(...) aquele que crê em mim, esse fará também as obras que eu faço, e fará ainda maiores (...)” (João 14:12)
A melhor forma de expressarmos nossa gratidão a Kardec, a seus colaboradores encarnados e aos Espíritos da Falange do Consolador, é a prática dos nobres valores ensinados pela Doutrina Espírita; é o nosso aperfeiçoamento como Espíritos imortais que somos, e nossa colaboração com a evolução de nosso semelhante e nosso próprio Planeta.


Leia também, neste blog, as postagens “Sobre As Mesas Girantes e o Espiritismo”, “Jesus, Kardec e Nós”, “Examinai Tudo. Retende o Bem.”, “Fluido Universal”, “A revolta”, “Evolução Espiritual de Longo Prazo” e “Espíritos missionários”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:
[1] XAVIER, Francisco Cândido. “O Espírito da Verdade”. 4.ed. Por Espíritos diversos. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1982. Capítulo 52.
[2] KARDEC, Allan. “Obras Póstumas”. 34.ed. Rio de Janeiro: RJ, FEB: 1991. Segunda Parte. “A minha primeira iniciação no Espiritismo”.
[3] KARDEC, Allan. “Revista Espírita de dezembro de 1869”. 1ª Edição. Rio de Janeiro: RJ, FEB: 2004. “Os Desertores”.
[4] KARDEC, Allan. “O Livro dos Espíritos”. 66.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Questões 642, 936, 952 e 957.
[5] XAVIER, Francisco Cândido. “Vinha de Luz”. Pelo Espírito Emmanuel. Capítulo 168.
[6] XAVIER, Francisco Cândido. “No Mundo Maior”. Pelo Espírito André Luiz. 20.ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1995. Capítulo 16.
[7] KARDEC, Allan. “Obras Póstumas”. 34.ed. Rio de Janeiro: RJ, FEB: 1991. Segunda Parte. “Meu guia espiritual”.
[8] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Capítulo VI (“O Cristo Consolador”), item 04.