domingo, 9 de agosto de 2009

A Reencarnação na Bíblia

A reencarnação consiste em admitir para o Espírito muitas existências sucessivas. Tal ideia não é nova e já era crença de indianos, egípcios, gregos e judeus. No próprio Velho Testamento há indicações claras a esse respeito.

No capítulo segundo de “Gênesis”, versículo 9, lê-se : “Fez Deus Jeová brotar do solo toda a sorte de árvores gratas à vista, e boas para comida; também a árvore da vida no meio do jardim, e a árvore do conhecimento do bem e do mal.”, conforme a tradução da Sociedade Bíblica Britânica. Todavia, a melhor tradução, segundo Severino Celestino, um estudioso da língua hebraica, seria: “E fez brotar Deus, da terra, toda árvore atrativa à vista e boa para alimento; e a árvore das vidas, dentro do jardim, e a árvore do conhecimento, do bem e do mal.”, pois a palavra utilizada para representar vida em hebraico significa vidas, sempre no plural. Dessa forma, árvore das vidas explicita a necessidade de mais de uma vida, ou seja, mais de uma encarnação, para o desenvolvimento do Espírito.

Ainda no livro “Gênesis”, no seu capítulo segundo, versículo 7, pela tradução da Sociedade Bíblica Britânica, lê-se: “Do pó da terra formou Deus Jeová ao homem, e soprou-lhes nas narinas o fôlego de vida; e o homem tornou-se um ser vivente.” A tradução feita diretamente do hebraico pelo mesmo estudioso, Severino Celestino, nos esclarece: “E formou Deus o homem do pó da terra. Ele insuflou em suas narinas um sopro de vidas e o homem se tornou alma vivente.”, ou seja, novamente a palavra vida deveria ser utilizada no plural, sopro de vidas. Adamá, em hebraico, é terra. Adão, originariamente Adam, veio da palavra Adamá, e assim, Adão significa "filho da terra", não homem ou mulher, mas ambos, toda a humanidade. Allan Kardec também trouxe essa observação na obra “A Gênese”, em seu capítulo XII, itens 16 a 26. Alma vivente é o Espírito encarnado, conforme a resposta dos Espíritos Superiores a Kardec, à questão 134 de “O Livro dos Espíritos” ("Que é a alma?" Resposta: “Um Espírito encarnado.”).

No livro “Êxodo”, capítulo 20, versículo 5, na versão de Almeida Revisada Imprensa Bíblica, lê-se: “Não te encurvarás diante delas, nem as servirás; porque eu, o Senhor, teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam.” Conforme está escrito neste trecho, com o uso da preposição até, sem considerar-se o princípio da reencarnação, tem-se a ideia de que netos e bisnetos, inocentes, teriam de pagar por erros que foram cometidos por outros, que não eles, contrariando, assim, o conceito de justiça divina. Na tradução da Sociedade Bíblica Britânica, diferentemente, lê-se: “Não as adorarás, nem lhes darás culto, porque eu, Jeová teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos, na terceira e na quarta geração daqueles que me aborrecem.” Nessa tradução, verifica-se a utilização da preposição em (na = em + a), de forma que, há possibilidade do mesmo Espírito que se desviou do caminho do bem, tem a chance de, ele mesmo, reencarnado, como seu próprio neto ou bisneto, sofrer as consequências de seus atos, o que é conforme a justiça divina. Tal explicação encontra-se também em nota no capítulo I de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”.

No livro “Salmos”, no capítulo 19, versículo 7 (em algumas versões no versículo 8), a tradução sugerida por Severino Celestino, diretamente do texto hebraico, é: “O ensinamento de Deus é perfeito, faz o espírito voltar. O testemunho de Deus é verdadeiro, transforma o simples em sábio.” Nessa tradução, fica clara a reencarnação, pela volta do espírito a um novo corpo, corroborando que esse retorno faz parte da lei divina, do processo evolutivo do Espírito, sendo aplicável para todos. E complementa que, através das vidas sucessivas, o Espírito, inicialmente simples e ignorante, transforma-se em sábio, pelo seu próprio esforço. A palavra retorna, em outras versões, como a da Sociedade Bíblica Britânica, foi traduzida como refrigera: “A lei de Jeová é perfeita, e refrigera a alma; o testemunho de Jeová é fiel, e dá sabedoria ao simples.”

Ainda no livro “Salmos”, o famoso Salmo 23, na versão da Sociedade Bíblica Britânica é: “Jeová é o meu pastor; nada me faltará. Faz-me repousar em pastos verdejantes; conduz-me às águas de descanso. Ele refrigera a minha alma, guia-me nas veredas da justiça por amor do seu nome.”. A tradução sugerida por Severino Celestino é: “Adonai (Senhor) é meu pastor e não me faltará. Em verdes pastagens me fará descansar. Para a tranquilidade das águas me conduzirá. Fará meu espírito voltar ou retornar, e me guiará por caminhos justos, por causa do Seu nome” (Sl, 23:1-3). Dessa tradução destacam-se os pontos de análise:
a) Deus é que não faltará, diminuindo a importância de bens materiais, tradicionalmente indicada pela versão “nada me faltará”;
b) A ideia de volta do espírito conjugada com a tranquilidade das águas do versículo anterior sugere a reencarnação, através da volta do espírito ao corpo físico, protegido no líquido amniótico, a “tranquilidade das águas” (conforme Nascer de Água, neste Blog).

Continuando no livro “Salmos”, lê-se no capítulo 71:20: “Tu, que nos fizeste ver muitas e penosas tribulações, de novo nos restituirás à vida, e das profundezas da terra nos tornarás a trazer.”, segundo a versão da Sociedade Bíblica Britânica. Esta versão já deixa clara a ideia do retorno do Espírito à vida corporal, quando diz: restituirá à vida e das profundezas da terra nos tornarás a trazer, já que o corpo físico está relacionado, desde o Gênesis, com o pó da terra. Outras referências, como a de Almeida, Revisada e Corrigida, de 1995, não demonstram o sentido reencarnacionista do original em hebraico: “{Tu,} que me tens feito ver muitos males e angústias, me darás ainda a vida e me tirarás dos abismos da terra.”

No livro “Jeremias”, capítulo 1, versículo 5, conforme a Sociedade Bíblica Britânica, lê-se: “Antes que eu te formasse no ventre, te conheci; e antes que saísses da madre, te santifiquei: um profeta para as nações te constituí”.

Orígenes
(185 - 253 d.C.)

Orígenes comenta essa passagem, na sua obra “Dos Princípios”, em seu livro 3, capítulo 3, item 5, que: “Isso também, eu penso, deve ser questionado, especificamente, quais são as razões por que uma alma humana age uma vez para o bem e outra para o mal: a base da qual eu suspeito que seja mais antiga do que o nascimento corporal do indivíduo, como João (o Batista) mostrou por pular e exultar no ventre de sua mãe, quando a voz de saudação de Maria chegou aos ouvidos de sua mãe Isabel; e quando Jeremias o profeta declara que era conhecido por Deus antes de ser formado no útero de sua mãe, e antes de ter nascido era santificado por Ele, e enquanto ainda um garoto recebeu a graça da profecia. E outra vez, por outro lado é exibido sem dúvida que alguns foram possuídos por espíritos hostis desde o início de suas vidas; isto é, alguns nascidos com um espírito mau; e outros, de acordo com histórias críveis, praticaram atos divinos desde a infância. (...) Para todas estas instâncias, esses que sustentam que tudo no mundo está sob a administração da Providência Divina (como é também nosso credo), não podem, como parece para mim, dar outra resposta, de forma a mostrar que nenhuma sombra de injustiça se assenta sobre o governo divino, além de sustentar que houve certas causas de existência anterior, em consequência das quais as almas, antes de seu nascimento no corpo, contraíram um certo montante de culpa em sua natureza sensível, ou em seus atos, por conta dos quais eles foram julgados dignos pela Providência Divina de ser alocados nessa condição. Porque uma alma sempre possui o livre-arbítrio, tanto quando está no corpo como quando está sem ele; e liberdade de vontade está sempre direcionada para o bem ou para o mal. Nem pode algum ser racional e consciente, isto é, uma mente ou alma, existir sem algum ato bom ou mau. E é provável que esses atos forneçam bases para mérito mesmo antes de fazerem qualquer coisa neste mundo; de forma que por conta desses méritos ou justificativas eles estão, imediatamente em seu nascimento, e mesmo antes dele, por assim dizer, classificados pela Divina Providência para a jornada do bem ou do mal.” (tradução livre nossa da versão em inglês).

Lucas 1:39-56

A ideia de retorno à vida física após a morte do corpo físico era aceita pelo povo hebreu. Jesus viveu entre os judeus e para entendê-lo, necessário se faz entender sua crença. A primeira passagem encontra-se descrita no Evangelho de Mateus, capítulo 16, versículos 13 e 14, nos quais indica-se que o povo esperava o Messias, pensando que este era João Batista (este ainda encarnado) ou outros, como Elias, Jeremias ou algum dos profetas (estes todos já desencarnados há séculos e que, se voltassem, estariam com outra roupagem física). A segunda passagem, também do Evangelho de Mateus, capítulo 17, versículos 10 a 13, os discípulos perguntaram ao Mestre sobre a volta de Elias a que o Mestre respondeu que o Elias já havia voltado e fizeram com ele como lhes aprouve e os discípulos compreenderam que Elias teria vindo como João Batista. Dessa forma, eles compreendiam que a reencarnação era fato e que o corpo com que o Espírito retornava era diferente do que animava antes.

Na Epístola de Paulo aos Hebreus, capítulo 9, versículo 27, conforme a Sociedade Bíblica Britânica, diz-se: “Porquanto é ordenado aos homens que morram uma só vez (e depois disto vem o juízo),”. Estaria esse versículo contrariando a reencarnação e o próprio ensinamento do Mestre? Decerto que não. O que morre uma só vez é o corpo físico, é a personalidade atual do homem. Conforme Severino Celestino, Paulo não disse que se vive só uma vez, o que realmente iria contra a reencarnação e a conversa de Jesus com Nicodemos, em João, 3:3. Para cada encarnação, com a morte do corpo físico, segue-se uma avaliação dessa sua vivência (um julgamento, não o julgamento final), necessária para a programação de sua próxima encarnação. A tradução de Severino Celestino, diretamente do hebreu, é: “E como é um fato que os homens devem morrer uma só vez, depois do que vem um julgamento.”

A reencarnação, como lei divina, pode ser comprovada nos textos sagrados de diversas culturas, como foi feito, considerando-se como ponto de partida, a Bíblia, compreendendo-se tanto o Velho quanto o Novo Testamento.


Leia também, neste blog, a postagens “Pecado — Hamartia — Peccatu” e “A Reencarnação na Bíblia”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio



Baseado em palestra de Severino Celestino da Silva, autor do livro “Analisando as traduções bíblicas”.
As traduções bíblicas foram consultadas no site Bíblia on line (www.bibliaonline.com.br).
A obra "Dos Princípios" foi consultada no site Church Fathers (www.newadvent.org/fathers/0412.htm).

Outros livros:
O Livro dos Espíritos de Allan Kardec
O Evangelho Segundo o Espiritismo de Allan Kardec

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