domingo, 27 de junho de 2010

Nas Questões Medianímicas

Pelo Espírito Marco Prisco

Diante de alguém com a mente em desalinho você logo afirma: “é um médium”.
Seja prudente.
Perturbação psíquica não é síndrome de mediunidade.

***

Examinando alguém em estado de obsessão você prescreve: “necessita desenvolver a mediunidade”.
Guarde cautela.
Desenvolver mediunidade não significa elastecê-la, mas discipliná-la.

***

Considerando os distúrbios emocionais da época você exclama, exaltado: “todos são médiuns obsidiados”.
Faça-se comedido.
Sintetizar todas as misérias morais e mentais na mediunidade é o mesmo que amaldiçoá-la.

***

Ouvindo uma pessoa narrar as próprias dificuldades você é taxativo: “mediunidade manipulada por obsessores”.
Adote a vigilância.
Há obsidiados que são perseguidos em si mesmos pelas íntimas imperfeições.

***

Ante qualquer infortúnio que lhe chega ao conhecimento você elucida: “a mediunidade sem assistência é a causa-matriz”.
Examine melhor a questão.
Os efeitos de hoje nasceram nas causas do passado.

***

Perante um companheiro em sofrimento, você logo informa: “mediunidade com francas possibilidades”.
Evite explicações apressadas.
Sofrimento é débito em regime de resgate.

***

Sim, somos todos médiuns, porque sempre estamos no meio...
A mediunidade a que você se refere, que é encontrada na História em todas as épocas, e que nos deu as sublimes informações espiritistas é faculdade abençoada que não pode ser examinada num lapso de tempo entre um conceito e uma banalidade.


***

Quando você estiver à frente de alguém com problemas psíquicos de natureza medianímica, não opine, invigilante; receite “O LIVRO DOS MÉDIUNS”, guia eficaz para quem deseja servir com segurança, construindo o próprio equilíbrio.
Quanto possível, restrinja opiniões vulgares em torno da mediunidade, se você deseja ajudar, para que a mordacidade e a zombaria não lhe aplaudam os conceitos sobre uma faculdade que possivelmente você não conhece com propriedade nem exatidão.




FRANCO, Divaldo P. “Ementário Espírita”. 4ª ed. Pelo Espírito Marco Prisco. Matão, SP: Casa Editora O Clarim.

Bons estudos!
Carla e Hendrio



quinta-feira, 24 de junho de 2010

A Influência de “Maus” Espíritos

“Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem.” (Carta de Paulo aos Romanos 12:21)

Para analisarmos se há meios de neutralizar a influência de “maus” Espíritos, devemos compreender a que se refere quando tachamos um Espírito de “mau”. De posse desse entendimento, podemos estabelecer as medidas de modificação interna para evitar más influências. Não busquemos fora de nós, em “culpados” externos, as causas e os remédios para nossos desafios. O caminho está em efetuar nossa evolução moral, seja para resolver o que podemos, seja para confiar em Deus e nos resignarmos ao que presentemente se encontre fora de nosso alcance.

Através das respostas a diversas questões de “O Livro dos Espíritos” [1], concluímos que ninguém inicia sua existência intrinsecamente bom ou mau (questão 115); que ninguém retrograda (questão 118); que ninguém é fadado ao mal — pelo contrário, todos os seres são destinados a evoluir, ao bem, mesmo que isso leve inúmeros séculos para se concretizar (questões 116 e 125), e que são os próprios Espíritos que se melhoram (questão 114). Possuímos um guia de procedimento no bem em nossa consciência (questão 621), a qual podemos, voluntária e temporariamente, “entorpecer”, mas que torna a nos aconselhar quando nos dispusermos a ouvi-la [2].

Lembramos que, em “O Livro dos Espíritos”, entre os itens 96 e 113, Allan Kardec apresenta uma escala didática das ordens de Espíritos, parametrizada pelas conquistas morais e intelectuais dos seres. Entendamos, porém, que se trata de uma referência didática, e não de um instrumento para rotular pessoa alguma. Não cometamos o erro de “pendurar um cartaz no pescoço” de qualquer ser, tachando-o de “Espírito leviano” (item 103 da obra citada) porque, em nosso entender, apresentou uma atitude irrefletida; ou rotulando-o como “Espírito de sabedoria” (item 110 do mesmo livro) ao ver nele uma boa ação. Todos nós somos Espíritos em processo de aperfeiçoamento; estamos sujeitos a alternar atitudes bondosas e elevadas com atitudes menos felizes, e não gostaríamos de ser rotulados de “maus” Espíritos por momentos pontuais infelizes de nossa história. Espíritos sábios não precisam de elogios; e os que nos pareçam ainda não comprometidos com o bem (não dispomos de elementos suficientes para julgar ninguém), não precisam de um rótulo, precisam de orientação, paciência e preces para ouvirem as boas inspirações que sempre recebem, como todo filho de Deus que todos somos.


Portanto, há Espíritos que temporariamente escolheram abster-se de praticar o bem; não há “senhores das trevas”, destinados ao mal desde sua criação e destinados ao mal eterno. O que pode haver são oponentes, Espíritos com os quais, ao longo de nossas vidas, criaram-se animosidades, as quais cumpre a nós fazer nossa parte para sanar, pelo exemplo na prática do bem, não somente e diretamente a esses oponentes, mas a todos que estiverem ao nosso alcance. É da palavra semítica šṭn, significando adversário ou acusador, que advêm os termos shatán, do hebraico, traduzido como aquele que acusa, inclusive em termos jurídicos, num tribunal; shaytán, do árabe, o qual tem os significados de adversário ou acusador, bem como de serpente; e diábolos, do grego, procedente do verbo dia-ballö, possuindo um significado semelhante de oposição ou confronto.

Esse entendimento é importante para não encararmos uma influência negativa como um inimigo, mas como uma emanação de um Espírito necessitado de esclarecimento e de aceitar oportunidades de evolução moral. Influenciamos e somos influenciados, o tempo todo, pelos pensamentos, palavras e ações nossos e alheios. Neste sentido é que todos somos médiuns.

Allan Kardec propôs à questão 469 de “O Livro dos Espíritos”, por que meios podemos neutralizar a influência dos maus Espíritos, respondida pelos Espíritos da Falange do Consolador prometido por Jesus com as seguintes palavras: “Praticando o bem e pondo em Deus toda a vossa confiança, repelireis a influência dos Espíritos inferiores e aniquilareis o império que desejem ter sobre vós. Guardai-vos de atender às sugestões dos Espíritos que vos suscitam maus pensamentos, que sopram a discórdia entre vós outros e que vos insuflam as paixões más. Desconfiai especialmente dos que vos exaltam o orgulho, pois que esses vos assaltam pelo lado fraco. Essa a razão por que Jesus, na oração dominical, vos ensinou a dizer: ‘Senhor! não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal.’”

Jamais ficamos desamparados pelos Espíritos que trabalham pelo nosso bem. Pela manutenção de um foco elevado em nossos pensamentos, especialmente pela prece, sempre recebemos seu auxílio. A esse respeito, Kardec pondera [3]: “Se os Espíritos inspiram de maneira oculta, é para deixar ao homem o livre-arbítrio e a responsabilidade de seus atos. Se receber inspiração de um Espírito mau, pode estar certo de receber, ao mesmo tempo, a de um bom, pois Deus jamais deixa o homem sem defesa contra as más sugestões. Cabe a ele pesar e decidir conforme a sua consciência.”

Assim, o recurso que temos à nossa disposição para neutralizar essa influência é a prática da caridade, em todas as suas facetas, seja material, seja moral; manter os pensamentos voltados para o bem em qualquer situação; e por fim, confiando em Deus, que nos protege de tantas outras influências e acontecimentos dos quais nem temos a menor noção.

Mais uma vez, o autoconhecimento, exposto à questão 919 de “O Livro dos Espíritos”, é necessário. Expliquemos: os Espíritos inferiores, em nos influenciando, desejam estimular as imperfeições que ainda possuímos. Se temos conhecimento de nossas imperfeições e estamos empenhados em combatê-las, será mais difícil sucumbirmos a essas influenciações.


Leia também, neste blog, as postagens “Influência do Meio”, “O Céu e o inferno”, “Pressentimentos”, “Focos de desequilíbrio espiritual”, “Tranquilidade no Retorno à Pátria Espiritual”, “A Porta Estreita”, “Brilhe vossa Luz”, “Causa da Obsessão”, “Simples e Ignorantes 1 e 2”, “O Bem e o Mal”, “Pecado — Hamartia — Peccatu” e “Atuação do Espírito Protetor”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:

[1] KARDEC, Allan. “O Livro dos Espíritos”. 66ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Questões 96 a 112, 114 a 116, 118, 125, 469, 621 e 919.
[2] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Capítulo XIII, item 10.
[3] KARDEC, Allan. “Revista Espírita de março de 1864”. São Paulo, SP: IDE, 1993. “Uma Rainha Médium”.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Considerações sobre o Aborto Espontâneo

Será que uma gestação interrompida devido a abortamento não induzido ou involuntário deve ser vista necessariamente como uma frustração para os pais e para o Espírito cujo corpo denso fora abortado? Uma doença congênita, que leve o reencarnante a óbito nos primeiros dias de nascimento ou mesmo durante a gestação, decorre de “falta de sorte genética”? Quando começa o planejamento reencarnatório: quando o Espírito é efetivamente ligado ao feto após a fecundação da célula-ovo, ou antes disso?

Pouquíssimo sabemos dos desígnios divinos, e menos ainda sabemos da história de vidas de cada um dos bilhões de seres, encarnados e desencarnados, que habitam a Terra, inclusive a nossa própria história pessoal de incontáveis existências corpóreas, neste planeta e em outros orbes antes deste. Incorreto é, portanto, fazerem-se generalizações. Verifiquemos as orientações dos Espíritos da falange do Consolador, bem como exemplos em obras espíritas subsidiárias, e tracemos algumas hipóteses, cônscios de nosso limitado alcance acerca da justiça de Deus.


Consciência, perispírito e enfermidade

Encontramos, à questão 166 de “O Livro dos Espíritos”, que uma alma que não alcançou a perfeição durante a vida corpórea, se depura pela prova de nova existência. A Doutrina Espírita ensina que o corpo físico é modelado por uma estrutura semimaterial, denominada perispírito. Diversas passagens da Codificação Espírita no-lo indicam, como, por exemplo, em “O Livro dos Espíritos”, à questão 135 e no item 257 (“Ensaio teórico da sensação nos Espíritos”). O que nossa consciência carrega de ações mais ou menos felizes impacta essa estrutura semimaterial, por isso há impacto, também, no corpo físico. Danos ao perispírito, muitas vezes, demandam diversas etapas de interação com a matéria densa, para serem sanados. Pode-se comparar o processo a um enxerto de pele ou osso em uma lesão, no qual sejam necessárias diversas operações, cada uma efetuando um passo adiante na reconstituição do dano. A duração nessas internações na matéria varia com a necessidade, podendo ser de vários anos após o nascimento a poucas horas de gestação, visando a um melhoramento no modelador biológico do Espírito em tratamento. Relevante é perceber que mesmo uma curta gestação, aparentemente fracassada em um aborto espontâneo, pode trazer enormes benefícios a um Espírito em processo de reconstituição de seu perispírito.

André Luiz orienta [1], a esse respeito: “Na Espiritualidade, os servidores da Medicina penetram, com mais segurança, na história do enfermo para estudar, com o êxito possível, os mecanismos da doença que lhe são particulares. Aí, os exames nos tecidos psicossomáticos com aparelhos de precisão, correspondendo às inspeções instrumentais e laboratoriais em voga na Terra, podem ser enriquecidos com a ficha cármica do paciente, a qual determina quanto à reversibilidade ou irreversibilidade da moléstia, antes de nova reencarnação, motivo por que numerosos doentes são tratáveis, mas somente curáveis mediante longas ou curtas internações no campo físico, a fim de que as causas profundas do mal sejam extirpadas da mente pelo contato direto com as lutas em que se configuraram.”

O mesmo autor espiritual apresenta outro exemplo [2] em que um Espírito requer mais de uma reencarnação para retificar seu perispírito, nas orientações recebidas do Espírito Clarêncio acerca de paciente denominado Júlio: “Desentendendo-se com alguns laços afetivos do caminho, no século passado, confiou-se a extrema revolta, aniquilando o veículo físico que lhe fora emprestado por valiosa bênção. Rendendo-se à paixão, sorveu grande quantidade de corrosivo. Salvo, a tempo, sobreviveu à intoxicação, mas perdeu a voz, em razão das úlceras que se lhe abriram na fenda glótica. Ainda aí, não se conformando com o auxílio dos colegas que o puseram fora de perigo, alimentou a ideia de suicídio, sem recuar. Foi assim que, não obstante enfermo, burlou a vigilância dos companheiros que o guardavam e arrojou-se a funda corrente de um rio, nela encontrando o afogamento que o separou do envoltório carnal. Na vida espiritual, sofreu muito, carregando consigo as moléstias que ele mesmo infligira à própria garganta e os pesadelos da asfixia, até que reencarnou, junto das almas com as quais se mantém associado para a regeneração do pretérito. Infelizmente, porém, encontra dificuldades naturais para recuperar-se. Lutará muito, antes de incorporar-se a novo patrimônio físico. (...) Júlio renascerá num equipamento fisiológico deficitário que, de algum modo, lhe retratará a região lesada a que nos reportamos. Sofrerá intensamente do órgão vocal que, sem dúvida, se caracterizará por fraca resistência aos assaltos microbianos, e, em virtude de o nosso amigo haver menosprezado a bênção do corpo físico, será defrontado por lutas terríveis, nas quais aprenderá a valorizá-lo.”

Na esclarecedora obra “Memórias de um Suicida” [3], Camilo Cândido Botelho, pela mediunidade de Yvonne do Amaral Pereira, orienta, a respeito da reconstituição da energia vital de suicidas: “A Excelsa Misericórdia encaminha, geralmente, tais casos, tidos como os mais graves, a reencarnações imediatas onde o delinquente completará o tempo que lhe faltava para o término da existência que cortou. Conquanto muito dolorosas, mesmo anormais, tais reencarnações serão preferíveis às desesperações de além-túmulo, evitando, ao demais, grande perda de tempo ao paciente. (...) O perispírito não teve forças vibratórias para modelar a nova forma corpórea, a despeito do auxilio recebido dos técnicos do mundo Invisível. Assim, concluirão o tempo que lhes faltava para o compromisso da existência prematuramente cortada, corrigirão os distúrbios vibratórios e, logicamente, sentir-se-ão aliviados. Trata-se de uma terapêutica, nada mais, recursos extremos exigidos pela calamidade da situação.”

Não associemos todo evento de aborto espontâneo a um suicídio em vida pregressa. Generalizar ou buscar “tabular” causas e consequências induz a conclusões errôneas e, não raro, injustas. Este é apenas um exemplo de causa de dano ao perispírito. Lembremos que toda atitude desarmônica pode danificar nossa energia vital, e desencarnações prematuras por mau uso de nossa vitalidade ao longo dos anos são vistas como formas lentas de extinção voluntária da vida. Temos todos de reparar nossos próprios erros, como orientam os Espíritos à questão 1013 de “O Livro dos Espíritos”, sobre o que se deve entender por purgatório: “Dores físicas e morais: o tempo da expiação. Quase sempre, na Terra é que fazeis o vosso purgatório e que Deus vos obriga a expiar as vossas faltas.”

Doença congênita não é, portanto, “falta de sorte genética”, pois Deus não nos abandona à sorte; esses eventos devem ser encarados como parte de um projeto de evolução moral. Moléstias não são castigos, mas sim provas ou expiações para o reencarnante e/ou família, visando sempre à melhora de todos no campo moral. Não se espera uma “alegria” com a constatação da doença, mas sim a resignação com a certeza de superação do desafio, ainda que a cura se concretize após aquela vida física.


A desistência da prova

Havendo danos no perispírito do reencarnante, os quais venham a inviabilizar seu nascimento saudável, pode ocorrer de o Espírito que sofre este processo desistir de passar pelo mesmo, apesar de essa ocorrência ser útil à sua reconstituição. Assim orientam os Espíritos superiores, à questão 348 de “O Livro dos Espíritos”, sobre se o Espírito reencarnante pode saber, previamente, que seu futuro corpo é inviável: “Sabe-o algumas vezes; mas, se nessa circunstância reside o motivo da escolha, isso significa que está fugindo à prova.” Ser bem sucedido não corresponde apenas a nascer saudável, mas a se melhorar, evoluir. Se, para tal melhora, se fazem necessários breves estágios de contato perispiritual com a matéria densa, desistir dessas etapas é fugir ao tratamento, evadir-se à prova, atrasar sua marcha evolutiva.

Lemos, à questão 345 da obra supracitada, que, “(...) como os laços que ao corpo o prendem são ainda muito fracos, facilmente se rompem e podem romper-se por vontade do Espírito, se este recua diante da prova que escolheu. Em tal caso, porém, a criança não vinga.” Todavia, não há como outro Espírito passar a ocupar o corpo destinado ao Espírito que desistiu de reencarnar.

As orientações constantes da questão 355 do mesmo livro indicam haver, de fato, crianças que, já no ventre materno, não são viáveis biologicamente: “(...) Deus o permite como prova, quer para os pais do nascituro, quer para o Espírito designado a tomar lugar entre os vivos.” A pergunta de número 356 indica, também, haver natimortos não destinados à encarnação de Espíritos, ocorrência a qual, não obstante, também traz utilidade evolutiva: “Alguns há, efetivamente, a cujos corpos nunca nenhum Espírito esteve destinado. Nada tinha que se efetuar para eles. Tais crianças então só vêm por seus pais.” Mesmo nestas condições, este corpo não é inútil. Os Espíritos esclarecem, à questão 360: “Por que não respeitar as obras da criação, algumas vezes incompletas por vontade do Criador? Tudo ocorre segundo os seus desígnios e ninguém é chamado para ser seu juiz.”


Planejamento reencarnatório

Allan Kardec questiona, à pergunta 353 de “O Livro dos Espíritos”: “Não sendo completa a união do Espírito ao corpo, não estando definitivamente consumada, senão depois do nascimento, poder-se-á considerar o feto como dotado de alma?”, ao que os Espíritos instruem: “O Espírito que o vai animar existe, de certo modo, fora dele. O feto não tem pois, propriamente falando, uma alma, visto que a encarnação está apenas em via de operar-se. Acha-se, entretanto, ligado à alma que virá a possuir.” Verificamos, aí, a existência de um planejamento, muito anterior à fecundação propriamente dita. Um edifício começou por um projeto, o que não significa que ele não era nada, ou que nada havia sido ainda investido de tempo, energia e recursos quando esse prédio não estava no início de sua existência material e era “apenas” uma série de cálculos e desenhos.

André Luiz nos traz dois ilustrativos exemplos disso:

  • Em “Missionários da Luz” [4], verifica-se um planejamento reencarnatório e ligação psíquica que antecedem, em muito, a efetiva ligação do perispírito à célula-ovo fecundada materialmente: “Desde muito, e, particularmente, desde a semana passada, está em processo de ligação fluídica direta com os futuros pais.”;
  • Na obra “E a Vida Continua...” [5], observamos um planejamento reencarnatório com trinta anos de antecedência, visando a resgatar determinados procedimentos inadequados de alguns dos Espíritos da história narrada: “Ribas apanhou pequeno mapa, dentre os papéis que compulsava, e elucidou, indicando figurações aqui e ali: – A desencarnação de Elisa está prevista para breves dias, mas o renascimento dela, depois de reequilíbrio seguro em nossa estância, poderá ocorrer, conforme nosso esquema, dentro de cinco a seis anos. Com a permissão de nossos Maiores, será ela filha de Serpa e Vera, se vocês trabalharem no socorro a ambos, com muito amor... Renascerá depois de Mancini, que lhes será o primogênito... Como é fácil de perceber, daqui a trinta anos, mais ou menos, ocasião considerada provável para o retorno de Caio à Vida Espiritual, devolverá ele à sogra espoliada – então sua filha – tanto quanto a Vera Celina, na condição de viúva, todos os patrimônios de que hoje se apropria.”

Verifica-se, então, que uma célula-ovo, esteja ou não conectada efetivamente com um Espírito — o que nunca sabemos, por não haver ainda instrumentação para tal — pode ser parte integrante de um planejamento de décadas, e, por isso, merece todo respeito, como qualquer criação de Deus.


Concluindo...

Tudo é supervisionado por Deus através de seus filhos já evoluídos, como o é Jesus, Governador da Terra.

O que vimos como sucesso e fracasso, se pautado sob uma estreita perspectiva de uma só vida, mostra-se totalmente diferente ao entendermos haver a sabedoria de Deus em tudo, em um planejamento de longuíssimo prazo, de muitos milênios, visando à nossa evolução moral e intelectual. Demonstra-se, de forma clara, o quanto nossos Espíritos protetores trabalham por nós, com tanto tempo de antecedência, e o quanto temos a agradecer a Deus por seu concurso. Cabe a nós procurar agir da melhor maneira, buscando, pela prece, a inspiração desses bons Espíritos, de forma a não prejudicar esse planejamento.


Leia também, neste blog, as postagens “Considerações sobre o aborto induzido”, “Considerações sobre o aborto induzido (2)”, “Considerações sobre o aborto induzido (3)”, “Mortes prematuras”, “Evolução Espiritual de Longo Prazo”, “Considerações sobre a pluralidade das existências”, “O Corpo Físico”, “Expiação, Prova e Missão” e “Considerações sobre a pluralidade das existências (2)”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:

[1] XAVIER, Francisco Cândido. “Evolução em Dois Mundos”. Pelo Espírito André Luiz. 14ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1995. Segunda parte, capítulo 19.
[2] XAVIER, Francisco Cândido. “Entre a Terra e o Céu”. Pelo Espírito André Luiz. 17ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1997. Capítulos 09 e 20.
[3] PEREIRA, Yvonne do Amaral. “Memórias de um Suicida”. 22ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 2000. Segunda parte, capítulo I.
[4] XAVIER, Francisco Cândido. “Missionários da Luz”. Pelo Espírito André Luiz. 25ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1994. Capítulo 13.
[5] XAVIER, Francisco Cândido. “E a Vida Continua...”. Pelo Espírito André Luiz. 24ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1998. Capítulo 22.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

A Fé

“Ora a fé é a substância das coisas esperadas, a prova das coisas não vistas.” (Hebreus 11:01)
“Anulamos, pois, a Lei pela fé? De modo nenhum, antes estabelecemos a Lei.” (Romanos 03:31)
“DOM JUAN - Em que coisa eu acredito?
SGANARELLE - Sim.

DOM JUAN - Eu acredito que dois e dois são quatro, Sganarelle, e que quatro e quatro são oito.

SGANARELLE - Bela crença, essa aí! Sua religião, pelo que vejo, é então a aritmética?

(Molière. “Dom Juan”, 1665)

A palavra fé tem sua origem na palavra do latim “fides”. Esse verbete latino significa lealdade; honestidade; crédito; confiança [1].

Jesus instrui os discípulos, em Mateus 17:20, nos seguintes termos: “(...) se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e ele passará. Nada vos será impossível.” Allan Kardec comenta esta passagem evangélica da seguinte forma [2]: “As montanhas que a fé desloca são as dificuldades, as resistências, a má vontade, em suma, com que se depara da parte dos homens, ainda quando se trate das melhores coisas. Os preconceitos da rotina, o interesse material, o egoísmo, a cegueira do fanatismo e as paixões orgulhosas são outras tantas montanhas que barram o caminho a quem trabalha pelo progresso da Humanidade.”

Percebemos, no trecho acima citado da obra “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, que muito do que parece impossível pode ser atingido pelo foco, determinação e confiança pautados pela humildade, que a fé traz. Vemos, também, que fé não se trata de fanatismo ou credulidade cega, sendo esses dois últimos destituídos de base. Quem descrê de forma sistemática na existência de tudo fora da matéria e acredita única e cegamente em princípios científicos, apenas por se dizerem científicos e sem lhes conhecer ao menos os fundamentos, está praticando um ato de fanatismo materialista.

O matemático austríaco Kurt Gödel apresentou, em 1931, o chamado “Teorema da Incompletude” [3], também designado como os dois “Teoremas da Indecidibilidade”. Em essência, esse Teorema afirma:

  1. Há proposições que não podem ser provadas usando os axiomas (ou proposições) da aritmética, e por isso são consideradas verdadeiras;
  2. Se o sistema de axiomas da aritmética é consistente, tal consistência não pode ser provada.

Por conseguinte, premissas matemáticas, mesmo as simples como 1+1=2, não podem ser provadas matematicamente. Acredita-se nesse axioma e utiliza-se o mesmo de forma proveitosa à Humanidade. A Ciência, portanto, também necessita de atos de fé. Isso não a diminui; pelo contrário, apresenta mais uma face da complementaridade entre Ciência e Religião. Ambos devem partir de um ponto para se desenvolverem e produzirem o Bem. O Espiritismo se baseia em 29 premissas constantes da “Profissão de Fé Espírita Raciocinada”, constantes à Primeira Parte de “Obras Póstumas”, com a primeira delas apregoando que “há um Deus, inteligência suprema, causa primária de todas as coisas” [4].

O apóstolo Paulo de Tarso traz, na citação “a fé é a substância das coisas esperadas, a prova das coisas não vistas” (Carta aos Hebreus 11:01), profundas lições. Sendo a fé uma substância, ela é matéria, como o são os fótons, pelos quais as ondas são vistas como partícula. O pensamento, uma vez criado pelos Espíritos (que somos todos nós), é transmitido pelo Fluido Universal, iniciando o processo da criação do que se deseja, ou se espera. Toda obra humana inicia por seu projeto, e o pensamento nela é seu primeiro passo. Paulo indica que o ato de fé provê, ao coração, a evidência para se trilhar o caminho buscado, mesmo não se dispondo de todas as provas que o intelecto possa demandar.


Além das Ciências laica e Espírita, mais correntes de pensamento abordam a necessidade da fé. No Livro de Mórmon, publicado em 1830, cujo conteúdo, segundo a crença dos mórmons, foi enviado ao político e religioso norte-americano Joseph Smith Jr. por um Espírito de grande elevação, encontramos a seguinte orientação sobre a fé: “E agora, conforme falei com referência à fé — fé não é ter um perfeito conhecimento das coisas; portanto, se tendes fé, tendes esperança nas coisas que se não veem e que são verdadeiras.” (Livro de Mórmon; Livro de Alma, capítulo 32, versículo 21) [5]

Se a Ciência e a Religião requerem pontos de partida que demandam fé para serem aprendidos, então a fé também pode ser aprendida. O Codificador da Doutrina Espírita assim pontua a respeito do desenvolvimento da fé [6]: “(...) ela se adquire e ninguém há que esteja impedido de possuí-la, mesmo entre os mais refratários. Falamos das verdades espirituais básicas e não de tal ou qual crença particular. Não é à fé que compete procurá-los; a eles é que cumpre ir-lhe ao encontro e, se a buscarem sinceramente, não deixarão de achá-la.”

Ainda sobre o aprendizado da fé em conjunto com o raciocínio, Kardec orienta [6]: “A resistência do incrédulo, devemos convir, muitas vezes provém menos dele do que da maneira por que lhe apresentam as coisas. A fé necessita de uma base, base que é a inteligência perfeita daquilo em que se deve crer. E, para crer, não basta ver; é preciso, sobretudo, compreender. A fé cega já não é deste século, tanto assim que precisamente o dogma da fé cega é que produz hoje o maior número dos incrédulos, porque ela pretende impor-se, exigindo a abdicação de uma das mais preciosas prerrogativas do homem: o raciocínio e o livre-arbítrio. (...) A fé raciocinada, por se apoiar nos fatos e na lógica, nenhuma obscuridade deixa. A criatura então crê, porque tem certeza, e ninguém tem certeza senão porque compreendeu. Eis por que não se dobra. Fé inabalável só é a que pode encarar de frente a razão, em todas as épocas da Humanidade.”

Só Deus sabe tudo. Necessitamos partir de um ponto, nem sempre dotado de prova intelectual, mas necessariamente avalizado por nossa consciência como sendo o início do caminho que nos conduz à evolução por meio da prática do Bem ao outro e, por conseguinte, a nós próprios. Valorizemos nossa fé nos momentos alegres e difíceis. Respeitemos a diversidade e não tentemos impor nossa fé a ninguém. Jesus, nosso Mestre e Guia, tem fé em nossa evolução; tenhamos nós, também, fé nEle e em nós próprios.


Leia, também, neste blog, as postagens “Crer para ver”, “Evolução Espiritual de Longo Prazo”, “Fluido Universal” e “Os opositores da Doutrina Espírita”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:

[1] Wikcionário. Palavra fides. Disponível em http://pt.wiktionary.org/wiki/fides. Acesso em 11/06/2010.
[2] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1987. Capítulo XIX, item 02.
[3] Wikipédia. Teorema da Incompletude de Gödel. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Teorema_da_incompletude_de_G%C3%B6del. Acesso em 11/06/2010.
[4] KARDEC, Allan. “Obras Póstumas.” 27ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1995. Primeira parte. “Profissão de Fé Espírita Raciocinada”.
[5] “O Livro de Mórmon”. Livro de Alma, Capítulo 32. Disponível em http://scriptures.lds.org/pt/alma/32. Acesso em 11/06/2010.
[6] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97ª ed. Rio De Janeiro, RJ: FEB, 1987. Capítulo XIX, item 07.