quinta-feira, 25 de junho de 2009

Platão e a Reencarnação

À Introdução de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, no item IV, Kardec afirma: “As grandes ideias jamais irrompem de súbito. As que assentam sobre a verdade sempre têm precursores que lhes preparam parcialmente os caminhos. Depois, em chegando o tempo, envia Deus um homem com a missão de resumir, coordenar e completar os elementos esparsos, de reuni-los em corpo de doutrina. Desse modo, não surgindo bruscamente, a ideia, ao aparecer, encontra espíritos dispostos a aceitá-la. Tal o que se deu com a ideia cristã, que foi pressentida muitos séculos antes de Jesus e dos essênios, tendo por principais precursores Sócrates [469–399 a.C.] e Platão [428—347 a.C.].”

Platão, indicando a origem "do alto" das ideias,
e seu discípulo Aristóteles, o empírico, apontando para a Terra,
na pintura "A E
scola de Atenas", de Rafael (1483-1520)


Como Jesus, também Sócrates não deixou obras escritas, tendo suas ideias sido propagadas através de seu discípulo Platão. O Codificador, no mesmo item supracitado, apresenta um “Resumo da Doutrina de Sócrates e Platão”, comparando-a com o Cristianismo e Espiritismo. Nos itens 4 e 5, destaca-se o princípio da reencarnação. Exemplificando o item 5, Platão diz: “Após a nossa morte, o gênio, que nos fora designado durante a vida, leva-nos a um lugar onde se reúnem todos os que têm de ser conduzidos ao Hades, para serem julgados. As almas, depois de haverem estado no Hades o tempo necessário, são reconduzidas a esta vida em múltiplos e longos períodos.” Kardec a comenta nos seguintes termos: “É a doutrina dos Anjos guardiães, ou Espíritos protetores, e das reencarnações sucessivas, em seguida a intervalos mais ou menos longos de erraticidade.”

Na obra Fédon, em que o jovem Fédon relata seu testemunho nos últimos momentos de Sócrates antes de sua execução, Sócrates pondera: “Investiguemos, então, se é forçoso que tudo o que tenha algum contrário de nada mais possa originar-se a não ser desse mesmo contrário. Por exemplo: para ficar grande alguma coisa, é preciso que antes fosse pequena, sem o que não poderia aumentar.” Este continua: “Desse modo, ficamos também de acordo que tanto os vivos provêm dos mortos como os mortos dos vivos. Sendo assim, quer parecer-me que apresentamos um argumento bastante forte para afirmar que as almas dos mortos terão necessariamente de estar em alguma parte, de onde voltam a viver.” A reminiscência, destacada por Platão, corrobora o princípio da reencarnação, como é dito na mesma obra: “É também, Sócrates, voltou Cebete a falar, o que se conclui daquele outro argumento – se for verdadeiro – que costumas apresentar, sobre ser reminiscência o conhecimento, conforme o qual nós devemos forçosamente ter aprendido num tempo anterior o de que nos recordamos agora, o que seria impossível, se nossa alma não preexistisse algures, antes de assumir a forma humana. Isso vem provar que a alma deve ser algo imortal.”


Bons estudos!
Carla e Hendrio

quarta-feira, 24 de junho de 2009

O Jugo Leve

"Vinde a mim, todos vós que estais aflitos e sobrecarregados, que eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei comigo que sou brando e humilde de coração e achareis repouso para vossas almas, pois é suave o meu jugo e leve o meu fardo." (Mateus, 11:28-30)


Inicialmente, é necessário, para melhor compreender a metáfora, o sentido apropriado dos termos jugo e fardo. Segundo o Dicionário Aurélio, jugo, que também significa canga, pode ser definido como “pau que carregadores põem aos ombros para suspender fardos”. Por sua vez, fardo pode ser visto como carga, pacote, embrulho, volume. Fardo e jugo, vistos sob as definições supracitadas, podem ser vistos, respectivamente, como o que temos de missão e como escolhemos cumpri-las.



Buscar fazer nosso dever em observância à Lei do Cristo, comprometidos com a caridade em todas as suas formas, permite ver, num aparente sofrimento ou agressão, uma oportunidade de crescimento, e, portanto, um jugo mais suave. O cumprimento de nossa missão entremeado de reclamações torna a “vara” onde carregamos nosso “fardo” mais pesada e espinhosa do que o planejado.


Não acrescendo, à nossa missão, preocupações inúteis como apego desmedido a gozos materiais, não adicionamos carga extra a nosso fardo, e, portanto, ele se mantém leve, ou seja, proporcional ao que nos comprometemos a carregar em nosso planejamento reencarnatório — mantendo-o, assim, possível de ser suportado com a alma em paz.


Segundo Allan Kardec, em O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo VI, item 2, o jugo de Jesus é a observância da lei divina. Observar a lei divina é o modo como devemos nos conduzir na vida, ou seja, o “como” supracitado.


Leia, também, neste blog, a postagem “A Porta Estreita”.


Bons estudos!

Carla e Hendrio

terça-feira, 9 de junho de 2009

Não Vim Trazer a Paz, mas a Divisão

Não se interpreta a Bíblia literalmente...

Não penseis que eu tenha vindo trazer paz à Terra; não vim trazer a paz, mas a espada; – porquanto vim separar de seu pai o filho, de sua mãe a filha, de sua sogra a nora; – e o homem terá por inimigos os de sua própria casa. (S. MATEUS, 10:34 a 36.)


Vim para lançar fogo à Terra; e que é o que desejo senão que ele se acenda? – Tenho de ser batizado com um batismo e quanto me sinto desejoso de que ele se cumpra! Julgais que eu tenha vindo trazer paz à Terra? Não, eu vos afirmo; ao contrário, vim trazer a divisão; – pois, doravante, se se acharem numa casa cinco pessoas, estarão elas divididas umas contra as outras: três contra duas e duas contra três. – O pai estará em divisão com o filho e o filho com o pai, a mãe com a filha e a filha com a mãe, a sogra com a nora e a nora com a sogra. (S. LUCAS, 12:49 a 53.)



Resumo: Inicialmente, Kardec destaca que as palavras são de Jesus, apesar de a forma não favorecer o entendimento claro do pensamento que ele exprimia, já que sua missão era toda de paz. Destaca ainda que uma ideia nova encontra oposição, tanto maior quanto a importância dos resultados previstos. Assim, Jesus trazia uma ideia nova, toda de amor e bondade, que ia de encontro aos abusos dos fariseus, escribas e sacerdotes, gerando uma oposição que culminou com a morte de Jesus. Essa ideia, porém, sobreviveu à sua morte, pois que era verdadeira, engrandeceu-se e espalhou-se, enfrentando grandes lutas. Considera ainda que o Cristianismo surgiu na época propícia, quando o Paganismo já se apresentava exaurido. Quando as mesmas ideias foram trazidas por Sócrates, o povo, apesar de muito inteligente, ainda não estava preparado. Na época de Jesus, o caminho já estava aberto e os espíritos predispostos a essas ideias. Essas ideias, no entanto, também não foram bem compreendidas, gerando numerosas seitas que se lançaram em guerra umas contra as outras, por não compreender a ideia central do Cristo, que é a Caridade. Jesus quis dizer que sua doutrina não se estabeleceria pacificamente, que traria lutas sangrentas porque os homens não a teriam compreendido. Mas, de toda essa confusão, sairia triunfante a verdade. Assim, quando o campo estivesse preparado, seria enviado o Consolador, que restabeleceria todas as coisas, Kardec destaca ainda que o Espiritismo vem, na época prevista, realizar as promessas de Jesus, e, da mesma forma, enfrenta oposições, que agora não são mais sanguinolentas e sim de ordem moral, e que durarão menos do que as que o Cristianismo teve de enfrentar. Essas palavras de Jesus devem entender-se portanto, como a cólera que sua doutrina provocaria, em conflitos momentâneos, e não de uma ideia premeditada de causar confusão. O mal viria dos homens.
(Resumo de "O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. 23, itens 9 a 18)


Explicação da passagem evangélica: Carlos Torres Pastorino, na obra Sabedoria do Evangelho, volume 3, explica que: “A doutrina pregada por Jesus torna-se, pois, a ocasião (embora não a causa) desses conflitos, que terminarão em perseguições violentas e sanguinárias, e “os inimigos do homem são os de sua própria casa", fato explicado com pormenores alguns séculos antes pela Bhagavad-Gita.


(...) A individualidade (Jesus) declara ter vindo "lançar fogo sobre a Terra". Com efeito, a matéria inerte e mesmo a vivificada pela força da vida animal e psíquica, pode considerar-se apagada se não tiver em si o "fogo" do Espírito desperto, consciente de si, a trabalhar pela evolução. Quem lança esse fogo nos seres humanos é a individualidade, ao assumir seu legítimo posto de supremacia na criatura humana. Para lançar, porém, esse fogo espiritual, a individualidade necessita mergulhar no corpo físico, encarcerando-se na carne; e durante toda a sua permanência nesse mergulho, vive angustiada (synéchomai), ansiosa por libertação, a fim de voar livre em seu mundo próprio.


O Espírito, individualização da Centelha Divina, quando consegue comunicar seu fogo próprio espiritual (o "mergulho de fogo", conforme Mt 3:11; Mc 1:8; Lc 3:16) ao ser humano, sente em si a alegria de vê-lo arder na espiritualização integral; no entanto, seu aprisionamento lhe faz sofrer todas as restrições de um cárcere cheio de lutas. Com efeito, o domínio da individualidade numa criatura lança-a em lutas titânicas externas, embora garantindo uma paz interior inabalável.


Mas a "descida" da individualidade traz, não a paz, à personalidade, mas a divisão em dois, a "dicotomia" entre matéria e espírito. Se bem que a matéria nada mais seja que a condensação (congelamento) do espírito, ocorre que, no momento de a individualidade assumir o comando, a personalidade adquire a consciência de uma dualidade, da nítida separação (dicotomia), com a característica de oposição entre espírito e matéria. Centenas, e talvez milhares de autores já se referiram a essa luta entre os dois pólos "opostos" (positivo e negativo, Sistema e Anti-Sistema, alma e corpo). Há pois razões ponderosas de afirmar que, no mergulho na carne, a individualidade vem produzir, de início, a dicotomia entre espírito e matéria.


Essa divisão, todavia, não reside unicamente nas extremidades opostas. Também os planos intermediários estarão sujeitos a ela. Assim, numa "casa” (ou seja, numa pessoa humana), onde há cinco pessoas (o pai: o espírito; a mãe: a inteligência; o filho: o corpo astral; com sua esposa: o duplo etérico; a filha: a carne), a luta entre os elementos é grande e contínua. O pai ("espirito") quer impor-se ao filho (corpo astral, emoções), mas estas se opõem a ele; a mãe (inteligência) quer superar a filha (a carne), mas esta se rebela e não quer obedecer a ela, vencendo-a com o sono, o cansaço, etc.; a sogra (ainda a inteligência) busca dominar a nora (as sensações físicas), mas estas são mais poderosas e levam de vencida a inteligência. Quem não conhece a dificuldade de a inteligência desarraigar hábitos (vícios) como de fumo, de bebidas, de gula, de preguiça, etc"? Ou os obstáculos causados à inteligência pela fadiga do corpo? Ou o descontrole que o espírito sofre, perturbado pelas emoções da cólera e da raiva, do amor descontrolado e do ciúme, etc.?



Bem razão tem a individualidade de proclamar que não veio "lançar a paz, mas a espada". E por isso, "os inimigos do homem são os de sua própria casa", isto é, as máximas lutas que uma criatura tem que enfrentar são, realmente, contra seus próprios veículos inferiores, que causam os maiores distúrbios e perturbações, obstáculos e embaraços na caminhada da senda evolutiva. Muito mais fácil derrotar um inimigo externo que a si mesmo: "vencedor verdadeiro é o que vence a si mesmo", lemos algures. Indispensável, pois, harmonizar os veículos entre si e depois sintonizá-los com o Espírito.


Daí a conclusão: não é digno do Espírito, do Cristo Interno, quem "mais ama seu pai ou sua mãe, seu filho ou sua filha". No sentido em que estamos examinando a questão, essas palavras exprimem os veículos mais densos (da personalidade): seu intelecto, suas emoções, suas sensações, seu comodismo.


Quem mais ama essas partes personalísticas do que ao Cristo Interno, não é digno do Cristo Interno: está voltado para as falsas realidades transitórias terrenas, externas a seu verdadeiro EU, ao invés de apegar-se à realidade real perene, eterna, infinita. Não é digno da realidade, quem se apega às aparências. Não é digno da individualidade eterna, quem valoriza mais a personalidade momentânea. Não é digno do Espírito quem lhe prefere a matéria. Não é digno do Cristo, quem lhe antepõe o mundo e suas ilusões.”


Bons estudos!
Carla e Hendrio

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Nascer de água

O pesquisador Carlos Torres Pastorino indica, em sua obra "Sabedoria do Evangelho", volume 2*, que o trecho "Se um homem não renascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus" (João, 3:5) , da conversa com o fariseu de nome grego Nicodemos ("vencedor do povo"), Doutor da Lei e chefe dos judeus, teve várias interpretações. Tem-se, então:

1. Interpretação literal: adotada pela igreja Católico-Romana. Jesus diz a Nicodemos que a criatura só pode obter o Reino de Deus (salvar-se) se renascer pela água (que é mesmo a água física do batismo) e pelo espírito (que é a infusão do Espírito Santo). Daí ser traduzido o versículo 8 por "o vento sopra onde quer", como um simples exemplo da liberdade do Espírito. O batismo é um rito de iniciação que se tornou um "sacramento". A palavra latina sacramentum é a tradução do grego µυστεριον (mysterion), e corresponde aos mistérios gregos que se aplicavam aos catecúmenos (profanos que haviam recebido a instrução oral e estavam prontos para ser "iniciados" nos mistérios). Nesse sentido era usada a palavra sacramento. No século 4º, Ambrósio introduziu no latim a palavra grega mysterium, com o sentido de "coisa oculta", segredo não revelável a estranhos. O sacramento do batismo é a junção da água e das palavras que dão o Espírito, e se define: "sinal sensível que exprime e produz a graça santificante, permanentemente instituído por Jesus Cristo" (Tanquerey, Theologia Dogmatica, vol. III, n. 248). E Agostinho (Tratado 80, in Johanne n.3) confirma: No batismo há palavra e água. Tira a palavra, que fica? água pura. Se a palavra é unida ao elemento, temos o sacramento. Que força teria a água de lavar o coração, se não fossem as palavras"? (Patrol. Lat., vol. 35, col. 1810).

Essa é a única interpretação lícita, segundo o Concílio de Trento (1545 a 1563), na sessão 7, cânon 2:

"Si quis dixerit aquam veram et naturalem non esse de necessitate baptismi, atque ideo verba illa Domini nostri Jesu Christi: nisi quis renatus fueri ex aqua et Spiritu Sancto" ad metaphoram aliquam detorserit, anathema sit".

"Se alguém disser que não há necessidade de água verdadeira e natural para o batismo, e igualmente que devem ser interpretadas como metáfora as palavras de nosso Senhor Jesus Cristo: 'se alguém não renascer da água e do Espírito Santo', seja anátema".

Há, pois, uma interpretação fixada como dogma.

2. Interpretação alegórica: Foi justamente a condenada pelo Concílio de Trento, cujo artigo se dirigia contra Calvino e Grotius. Essa interpretação ainda é seguida pela maioria dos evangélicos (protestantes).

A explicação da "água" corresponde ao rito do batismo. Mas o "espírito" tem novo significado: é o renascimento moral, a vida nova ou o novo teor de vida no caminho de Cristo. O sentido do renascimento espiritual, com a morte do "homem velho" e o nascimento do "homem novo" é muitas vezes ensinado nas Escrituras, desde o Antigo Testamento: "Lançai de vós todas as vossas transgressões, com que errastes, e fazei-vos um coração novo e um espírito novo" (Ez.18:31); "Também vos darei um coração novo e dentro de vós porei um espírito novo" (Ez.36:26); "Se alguém está em Cristo, é uma nova criação: passou o que era velho, eis que se fez novo" (2 Cor.5:17); "Não mintais uns aos outros, tendo-vos despido do homem velho com seus feitos e tendo-vos revestido do homem novo" (Col.3:9); e ainda 2 Cor.2:11-13 ou Ef. 4:20-24 e Rom.6:3-11.

A tradução adotada no versículo 8 é também "vento", defendendo-se a tradução com a frase do Eclesiastes (11:5): "Tu não sabes o caminho do vento". Entretanto, aí a palavra usada não é πνευµα (pneuma), mas ανεµος (anemos). Quanto ao verbo pnei, se é usado com sentido de "soprar" com referência ao vento, também pode significar "agir, exteriorizar-se, manifestar-se" em relação ao espírito. O latim traduz πνευµα (pneuma) por "spiritus" e πνει (pnei) por "spirare", dentro do sentido grego. Mas também em português usamos o mesmo radical, quer se trate do espírito (inspiração) quer se trate do vento (respiração), que se divide em inspiração e expiração; e quando o espírito se retira, dizemos que a pessoa "expirou".

3. Interpretação físio-realista: Aceita pelos espiritistas, como ensino da realidade fisiológica do que ocorre com as criaturas. A tradução de "ανουεν" é "de novo", tal como a entendeu Nicodemos, que pergunta como pode "o homem, depois de velho, entrar pela segunda vez (δευτερον, deuteron) no ventre materno".

A essa indagação, longe de protestar que não era isso o que queria dizer, Jesus insiste e confirma suas palavras: "é o que te disse: indispensável se torna que o homem nasça de água (isto é, materialmente, com o corpo denso, dado que o nascimento físico é feito através da bolsa d’água do liquido amniótico) e de espírito (ou seja, que adquira nova personalidade no mundo terreno, em cada nova existência, a fim de progredir)." Se Nicodemos entendeu à letra as palavras de Jesus, o Mestre as confirma à letra e reforça seu ensino. Com efeito, o espírito, ao reentrar na vida física, pode ser considerado novo espírito que reinicia suas experiências esquecido de todo o passado.

Em grego não há artigo diante das palavras "água" e "espírito". Não é, portanto, nascer da água do batismo, nem do espírito, mas de água (por meio da água) e de espírito (pela reencarnação do espírito).

Daí a explicação que se segue: "o que nasce da carne (com artigo em grego) é carne", isto é, é o corpo físico, com toda a hereditariedade física herdada do corpo dos pais; e o que nasce do espírito é espírito", ou seja, o espírito que reencarna provém do espírito da última encarnação, com toda a hereditariedade pessoal que traz do passado". E Jesus prossegue: "por isso não te admires de eu te dizer: é-vos necessário nascer de novo". Observe-se a diferença de tratamento: "dizer-TE" no singular, e "é-VOS" no plural, porque o renascimento é para todos, não apenas para Nicodemos. E mais: "o espírito sopra (isto é, age, reencarna, se manifesta) onde quer, e não sabes donde veio (ou seja, sua última encarnação), nem para onde vai (qual será a próxima)."

As palavras de Jesus foram de molde a embaraçar Nicodemos, que indaga: "como pode ser isso"? E Jesus: "Tu que (entre nós dois) és o Mestre de Israel, te perturbas com estas coisas terrenas? Que te não acontecerá, então, se te falar das coisas celestiais (espirituais)"?

Logicamente Jesus não podia esperar que Nicodemos entendesse as outras interpretações mais profundas desse ensinamento (como dificilmente poderia ter querido ensinar o rito do batismo, que não havia ainda sido instituído nem ordenado por ele, a essa época, quando só havia o "batismo" de João).

Depois exemplifica: "como Moisés ergueu a serpente no deserto, assim o Filho do Homem será erguido da Terra".

Paulo interpreta assim esse ensinamento de Jesus: "Mas quando apareceu a bondade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com os homens, não por obras de justiça que tivéssemos feito, mas segundo sua misericórdia nos salvou pelo lavatório da reencarnação, e pelo renascimento de um espírito santo" (Tit. 3:4-5). As palavras utilizadas são bastante claras e insofismáveis: lavatório (lavar com água; λουτρον (loutron) da reencarnação: παλιγγενεσια (paliggenesia) que é o termo técnico da reencarnação entre os gregos; pelo renascimento ("anaxinóseos") isto é, um novo nascimento). Paulo, pois, diz que Deus nos salvou não porque o tivéssemos merecido, mas por Sua misericórdia, servindo-se da palingenésia (isto é, da reencarnação) a qual é um "lavatório" (de água) e um "renascimento" do espírito.

Que o renascimento é feito através da água, já o diz o Gênesis (cfr.1:1-2; 1:6-7 e 2:4-7).




Nesse mesmo pensamento, se expressa o Codificador, na obra "O Evangelho Segundo o Espiritismo"**, capítulo IV, item 8: "segundo essa crença, a água se tornara o símbolo da natureza material, como o Espírito era o da natureza inteligente". Estas palavras: "se o homem não renasce da água e do Espírito, ou em água e em Espírito", significam, pois: "se o homem não renasce com seu corpo e sua alma."

Bons estudos!
Carla e Hendrio

*PASTORINO, Carlos Torres. "Sabedoria do Evangelho". Rio de Janeiro, RJ: Sabedoria, 1964. Volume 2. p. 2-6.
**KARDEC, Allan. "O Evangelho Segundo o Espiritismo". 2ª ed. de bolso. Rio de Janeiro: RJ, FEB: 1999.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Por que o Espiritismo é uma religião?

O livro A Doutrina Católica, de Boulanger, citado no livro Religião*, de Carlos Imbassahy, assim define religião:

"Religião – É palavra de origem latina:
a) vem de relegere, recolher, tratar com cuidado (oposto de neglegere, deixar de lado, descuidar), porque o homem religioso zela, com máximo empenho e profundo respeito, pelas coisas referentes ao culto de Deus. É a etimologia que dá Cícero;
b) outros autores, como Lactâncio, S. Jerônimo, S. Agostinho pensam que vem de religare, ligar, porque a religião tem, como base, os laços que unem o homem a Deus.”

Carlos Imbassahy, a partir de tal definição, conclui: “Pelas leis morais do Cristo, que segue; pela parte do Cristianismo, que representa; pela obrigação que se impôs de divulgar o Evangelho; pelo dever, que mantém, de colocar as leis divinas acima de tudo, como a fonte do progresso humano, o Espiritismo reivindica a parte que lhe cabe no seio das religiões.”

Porque nos religa a Deus, permitindo melhor compreensão dos ensinamentos de Jesus, o Espiritismo é também uma religião.



Bons estudos!
Carla e Hendrio

* IMBASSAHY, Carlos. “Religião”. 3ª ed. RIO DE JANEIRO, FEB: 1981.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Sobre As Mesas Girantes e o Espiritismo

Foi através do fenômeno das mesas girantes que o Prof. Hippolyte Léon Denizard Rivail começou seus estudos, que resultariam na publicação de O Livro dos Espíritos, marco inicial do Espiritismo.

O próprio Codificador descreve, no livro Obras Póstumas, que em 1854 ouviu falar das mesas girantes através de um amigo chamado Fortier. Esse fenômeno mediúnico agitava a Europa, incluindo a França. A imprensa, de quando em quando, estampava anedotas e charges sobre as mesas, tal como o fez, por exemplo, mais tarde, o jornal parisiense L’Illustration, de julho de 1854.

Nas palavras de Kardec, “foi aí que, pela primeira vez, presenciei o fenômeno das mesas que giravam, saltavam e corriam em condições tais que não deixavam lugar para qualquer dúvida. Assisti então a alguns ensaios, muito imperfeitos, de escrita mediúnica numa ardósia, com o auxílio de uma cesta. Minhas idéias estavam longe de precisar-se, mas havia ali um fato que necessariamente decorria de uma causa. Eu entrevia, naquelas aparentes futilidades, no passatempo que faziam daqueles fenômenos, qualquer coisa de sério, como que a revelação de uma nova lei, que tomei a mim estudar a fundo.


Leia, também, neste blog, a postagem “154 anos do Consolador Prometido”.

Bons estudos!
Carla e Hendrio