sábado, 29 de maio de 2010

Hermenêutica, Exegese e Espiritismo

Espíritas! amai-vos, este o primeiro ensinamento; instruí-vos, este o segundo. No Cristianismo encontram-se todas as verdades; são de origem humana os erros que nele se enraizaram. Eis que do além-túmulo, que julgáveis o nada, vozes vos clamam: “Irmãos! nada perece. Jesus-Cristo é o vencedor do mal, sede os vencedores da impiedade.” – O Espírito de Verdade. (Paris, 1860.) [1]

No Cristianismo e em outras religiões como o Budismo ou o Hinduísmo, há mais de uma vertente. Há, ainda, muitos ateus, seja por convicção, seja por desilusão com as religiões. Tanta heterogeneidade e divergência em uma parcela tão pequena do Universo que é a Terra... Por quê?

Toda compreensão que temos do mundo advém de uma pré-compreensão, baseada em coordenadas espaço-temporais, uma expressão da forma como estamos, por sermos Espíritos que já envergaram diversas personalidades ao longo dos séculos, e das lições aprendidas durante essas existências, tanto encarnados quanto na erraticidade (período entre encarnações). As diferentes histórias de evolução de vidas de cada um de nós implicam diferenças de visão, e daí uma série de entendimentos distintos sobre religião, tal como sobre política, sociedade, arte etc.

Necessitamos, assim, entender os campos de estudo da hermenêutica e da exegese e como essas ciências, ambas contempladas na Doutrina Espírita, nos ajudam a compreender tais diferenças. Segundo o dicionário Aurélio [2], temos:

  • Hermenêutica: Interpretação do sentido das palavras;
  • Exegese: Comentário ou dissertação para esclarecimento ou minuciosa interpretação de um texto ou de uma palavra.

Hans-Georg Gadamer é um autor decisivo no estudo da hermenêutica do século XX. Em seu livro “Verdade e Método” [3], lançado em 1960, Gadamer afirma:
“Quem quiser compreender um texto realiza sempre um projetar. Tão logo apareça um primeiro sentido no texto, o intérprete prelineia um sentido do todo. Naturalmente que o sentido somente se manifesta porque quem lê o texto, lê a partir de determinadas expectativas e na perspectiva de um sentido determinado. A compreensão do que está posto no texto consiste precisamente na elaboração desse projeto prévio, que, obviamente, tem que ir sendo constantemente revisado com base no que se dá conforme se avança na penetração do sentido.”

Allan Kardec, na obra “A Gênese” [4], lançada em 1868, ou 92 anos antes do livro supracitado de Gadamer, já trazia uma visão convergente com a que seria trazida pelo referido pensador do século XX:
“Neste século de emancipação intelectual e de liberdade de consciência, o direito de exame pertence a todos e as Escrituras não são mais a arca santa na qual ninguém se atreveria a tocar com a ponta do dedo, sem correr o risco de ser fulminado.
(...) Os homens só puderam explicar as Escrituras com o auxílio do que sabiam, das noções falsas ou incompletas que tinham sobre as leis da Natureza, mais tarde reveladas pela Ciência. Eis por que os próprios teólogos, de muito boa-fé, se enganaram sobre o sentido de certas palavras e fatos do Evangelho. Querendo a todo custo encontrar nele a confirmação de uma ideia preconcebida, giraram sempre no mesmo círculo, sem abandonar o seu ponto de vista, de modo que só viam o que queriam ver. Por muito instruídos que fossem, eles não podiam compreender causas dependentes de leis que lhes eram desconhecidas.
(...) Os homens, cada vez mais esclarecidos, à medida que novos fatos e novas leis se forem revelando, saberão separar da realidade os sistemas utópicos. Ora, as ciências tornam conhecidas algumas leis; o Espiritismo revela outras; todas são indispensáveis à inteligência dos Textos Sagrados de todas as religiões, desde Confúcio e Buda até o Cristianismo.”

Peguemos um pequeno exemplo, o da palavra grega “bapto”, citada à introdução da tradução do Novo Testamento, feita diretamente a partir do grego, lançada pelo Conselho Espírita Internacional [5]:
“Figuremos um exemplo singelo: o verbo grego ‘bapto’ (mergulhar, imergir, lavar), pelos processos de derivação das palavras, é responsável pela formação do substantivo ‘baptismo’ (mergulho, imersão, ato de lavar)”. Ao se traduzir esse substantivo por batismo, é impossível que o leitor moderno não associe o vocábulo aos temas teológicos ligados ao sacramento do batismo.
Todavia, urge reconhecer que essas teologias não existiam ao tempo em que os livros do Novo Testamento foram redigidos, ou melhor, não existiam nem mesmo igrejas nos moldes das atuais. Não possuímos sequer registros seguros de que os judeus, sistemática e institucionalmente, utilizavam a imersão em água como ritual para conversão de prosélitos.”

O Espiritismo busca a consistência das ideias pela chegada a conclusões convergentes, por meio de diversos estudos independentes, efetuados em locais e por grupos distintos. É um método científico, sem “ocultismo”. Kardec assim cita a respeito, no item II da Introdução de “O Evangelho Segundo o Espiritismo” [6]:
Uma só garantia séria existe para o ensino dos Espíritos: a concordância que haja entre as revelações que eles façam espontaneamente, servindo-se de grande número de médiuns estranhos uns aos outros e em vários lugares.
(...) Essa a base em que nos apoiamos, quando formulamos um princípio da doutrina. Não é porque esteja de acordo com as nossas ideias que o temos por verdadeiro. Não nos arvoramos, absolutamente, em árbitro supremo da verdade e a ninguém dizemos: ‘Crede em tal coisa, porque somos nós que vo-lo dizemos.’ A nossa opinião não passa, aos nossos próprios olhos, de uma opinião pessoal, que pode ser verdadeira ou falsa, visto não nos considerarmos mais infalível do que qualquer outro. Também não é porque um princípio nos foi ensinado que, para nós, ele exprime a verdade, mas porque recebeu a sanção da concordância.
Na posição em que nos encontramos, a receber comunicações de perto de mil centros espíritas sérios, disseminados pelos mais diversos pontos da Terra, achamo-nos em condições de observar sobre que princípio se estabelece a concordância. Essa observação é que nos tem guiado até hoje e é a que nos guiará em novos campos que o Espiritismo terá de explorar.”

Como a maioria da Humanidade terrestre é composta por seres em etapas mais básicas da evolução, ainda distantes dos Espíritos de maior alcance nos campos intelectual e moral, não se consegue a apreensão da essência dos fatos e ensinos. Apreendemos o que está fora de nós como um fragmento do real, uma faceta de uma dimensão, o que não significa que não haja outras facetas, outras dimensões, as quais podem ser apreendidas por outros e devem respeitadas inclusive por quem não as verificou ou mesmo com as quais não concorde. Respeitemos e valorizemos a divergência, o contraditório, desde que fundamentados em argumentos.


Todos nós apreendemos segundo nossos limites, nosso horizonte, o qual pode se ampliar, pelo aprendizado e estudo. Assim, o entendimento de um determinado texto implica uma ação de projetar sentidos, a partir do que o intérprete possui de compreensões prévias. O sistema, porém, se realimenta: ao mesmo tempo em que a ideia lida só tem como ser compreendida pelos entendimentos prévios do leitor, as novas informações recebidas auxiliam na modificação desse conjunto de compreensões prévias, as quais vão, portanto, se alterando.

Kardec também apontou esse caráter progressivo do entendimento da Doutrina Espírita, por exemplo, nos trechos a seguir apresentados, constantes dos itens 16 e 55 do primeiro capítulo da obra “A Gênese” [7]:
O Espiritismo e a Ciência se completam reciprocamente (...). Um último caráter da revelação espírita, a ressaltar das condições mesmas em que ela se produz, é que, apoiando-se em fatos, tem que ser, e não pode deixar de ser, essencialmente progressiva, como todas as ciências de observação. Pela sua substância, alia-se à Ciência que, sendo a exposição das leis da Natureza, com relação a certa ordem de fatos, não pode ser contrária às leis de Deus, autor daquelas leis. (...) Caminhando de par com o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará.

Complementando a Hermenêutica com a interpretação das palavras, a Exegese vem estudar os significados moral e espiritual dos textos. O Codificador do Espiritismo preocupou-se com esses dois aspectos, apresentando-os à Introdução de “O Evangelho Segundo o Espiritismo” [8]:
“É certo que tratados já se hão escrito de moral evangélica; mas, o arranjo em moderno estilo literário lhe tira a primitiva simplicidade que, ao mesmo tempo, lhe constitui o encanto e a autenticidade. (...) Para obviar a esses inconvenientes, reunimos, nesta obra, os artigos que podem compor, a bem dizer, um código de moral universal, sem distinção de culto. (...) Esse, entretanto, seria um trabalho material que, por si só, apenas teria secundária utilidade. O essencial era pô-lo ao alcance de todos, mediante a explicação das passagens obscuras e o desdobramento de todas as consequências, tendo em vista a aplicação dos ensinos a todas as condições da vida. Foi o que tentamos fazer, com a ajuda dos bons Espíritos que nos assistem.”

Quanto mais estudarmos e apreendermos esses conhecimentos, aplicando-os efetivamente em nossa vida prática, mais eficientes nos tornamos na tarefa de fazer o Bem. Respeitemos os posicionamentos divergentes, pois todos têm sua história particular de evolução, da qual decorrem seus entendimentos; bem como o respeito à diferença também é uma demonstração de caridade.


Leia também, neste blog, as postagens “Os Opositores da Doutrina Espírita”, “Falsos Cristos, falsos profetas e seus seguidores”, “Não Vim Trazer a Paz, mas a Divisão”, “Tranquilidade no Retorno à Pátria Espiritual”, “A Reencarnação na Bíblia” e “Mediunidade na Bíblia”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:
[1] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97ª ed. RIO DE JANEIRO, FEB: 1987. Capítulo VI, Item 5.
[2] HOLANDA, Aurélio Buarque de. “Novo Dicionário Eletrônico Aurélio”. Versão 5.0 de 2004. Positivo Informática. Palavras hermenêutica e exegese.
[3] GADAMER, Hans-Georg. “Verdade e Método”. 3.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. Segunda parte, item 2.
[4] KARDEC, Allan. “A Gênese”. 34ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Capítulo I, item 29.
[5] Novo Testamento. Tradutor Haroldo Dutra Dias; revisor Cleber Varandas de Lima. Brasília, DF: Conselho Espírita Internacional, 2010. Introdução.
[6] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97ª ed. RIO DE JANEIRO, FEB: 1987. Introdução, Item II.
[7] KARDEC, Allan. “A Gênese”. 34ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Capítulo I, itens 16 e 55.
[8] KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 97ª ed. RIO DE JANEIRO, FEB: 1987. Introdução, Item I.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

O Circuito da Comunicação

“Nenhum homem é uma ilha, completa em si mesma, cada homem é um pedaço do continente, uma parte do principal (...)” (John Donne) [1]
O que e como pensamos, falamos e agimos, ou seja, as formas pelas quais nos comunicamos, são determinantes de nossas companhias, em ambos os planos da vida. Expressando nossa afinidade por um tipo de atividade profissional, angariamos colegas nesse campo; demonstrando preferência por um estilo musical, atrairemos pessoas que compartilham tal gosto — pessoas essas encarnadas e desencarnadas, independente de se ter ou crer em mediunidade.

Como seres sociais, temos necessidade de nos comunicar com o outro. Através dessa comunicação, visando a fazer o Bem ao próximo, colaboramos não apenas com ele, mas com nossa própria evolução e, por decorrência, com a evolução vibratória da Terra. No sexto e sétimo capítulos da obra “Mecanismos da Mediunidade” [2], André Luiz indica características do fenômeno de comunicação mediúnica, os quais podem ser analisados também para intercâmbios de informação entre encarnados. Tais características são estudadas com analogia em grandezas físicas, modeláveis em fenômenos elétricos ou mecânicos. Vejamos algumas lições que tais análises podem trazer.


Circuito:

Tal como o circuito de uma corrida, um circuito elétrico é um caminho fechado, estabelecido, para a passagem de corrente elétrica. Uma comunicação entre duas pessoas, inclusive uma conversa entre dois encarnados, é um circuito de comunicação, pois cada um, em dado momento, envia suas ideias e, em outro instante, as recebe de seu interlocutor; é um caminho estabelecido de comunicação. Quanto melhor sintonizado esse circuito, com máximos respeito e paciência para ouvir, tanto melhor e com menos esforço fluirá a corrente de ideias.

Circuito mediúnico.

Nas palavras de André Luiz na obra supracitada, “O circuito mediúnico, dessa maneira, expressa uma ‘vontade-apelo’ e uma ‘vontade-resposta’, respectivamente, no trajeto ida e volta, definindo o comando da entidade comunicante e a concordância do médium, fenômeno esse exatamente aplicável tanto à esfera dos Espíritos desencarnados, quanto à dos Espíritos encarnados, porquanto exprime conjugação natural ou provocada nos domínios da inteligência, totalizando os serviços de associação, assimilação, transformação e transmissão da energia mental.”


Capacitância:

Eletricamente, componentes com essa característica apresentam oposição a variações de potencial, ou tensão (Volts), bem como a possibilidade de armazenar energia sob a forma de campo elétrico. Mecanicamente, uma caixa d’água pode ser comparada a um capacitor: armazena água, a qual pode ser utilizada após, esvaziando ou “descarregando” este reservatório. Eletricamente, um capacitor pode fornecer a energia que armazenara, como uma bateria recarregável, embora a bateria e o capacitor operem por princípios diferentes.

Uma caixa d’água é um acumulador, de forma análoga a um capacitor.

Nosso pensamento demonstra sua capacitância quando uma “torrente” de ideias, externas e/ou de nosso mundo íntimo, parece começar a vir à tona, todas ao mesmo tempo, e necessitamos meditar, em oposição a essa variação ruidosa de potenciais de pensamento. Ao meditarmos, conseguimos organizar, armazenar e trabalhar os pensamentos, “carregando nossas baterias”.

No capítulo 6 de “Mecanismos da Mediunidade”, André Luiz orienta: “Em identidade de circunstâncias, no circuito mediúnico, capacitância exprime a propriedade pela qual se verifica o armazenamento de recursos espirituais no circuito, recursos esses que correspondem à sintonia psíquica. Os elementos suscetíveis de condensar essas possibilidades, no campo magnético da conjunção mediúnica, expressam-se na capacidade conceptual e interpretativa na região mental do médium, que acumulará os valores recebidos da entidade que o comanda, devolvendo-a com a possível fidelidade ao serviço do circuito mediúnico na ação do intercâmbio”.


Indutância:

Representa a oposição a variações de corrente elétrica (Ampères), bem como a possibilidade de armazenar energia sob a forma de campo magnético. Em um tipo de analogia entre fenômeno elétrico e mecânico, é equivalente à inércia de um corpo; por exemplo, é necessário aplicar determinada quantidade de energia para colocar em movimento um veículo parado, ou para freá-lo se estiver rodando. Uma parada brusca pode gerar consequências sérias. A indutância elétrica também podem ser verificada quando se insere ou retira da tomada o plug de um equipamento com chave ligada, e surge uma faísca, eventualmente trazendo danos ao equipamento ou risco físico a quem esteja por perto: é uma reação do circuito para que a corrente elétrica se mantenha como estava antes de intervirmos na tomada.

Bobina de indução, cujo circuito é aberto e fechado periodicamente para produzir faíscas (centelhas azuis na foto).

Em comunicações cotidianas, sentimos os efeitos da indutância da comunicação quando algum evento ou pessoa bloqueia subitamente uma conversa, como não deixando alguém terminar de expor suas ideias, fato usualmente desagradável a quem é interrompido e, não raro, gerador de dissabores e conflitos.

Na obra supracitada de André Luiz, lemos: “(...) o circuito mediúnico, envolvendo implementos fisiopsicossomáticos e tecidos celulares complexos no plano físico e no plano espiritual, mostra-se fortemente indutivo e não deve ser submetido a interrupções intempestivas, sendo necessário atenuar-se-lhe a intensidade, quando se lhe trace a terminação, para que se impossibilite a formação de extracorrentes magnéticas, capazes de operar desajustes e perturbações físicas, perispiríticas e emocionais, de resultados imprevisíveis para o médium, quanto para a entidade em processo de comunicação.” Elisabeth d’Espérance narra, no livro “No País das Sombras” [3], episódio em que, em uma experiência de materialização, um espectador do fenômeno agarrou o Espírito Iolanda, materializado com o uso da energia doada por Elisabeth, a qual se encontrava inclusive em outro cômodo. Assim, interrompeu-se bruscamente o circuito mediúnico e houve grande impacto à energia vital da médium, quase levando Elisabeth d’Espérance à desencarnação.


Resistência:

Observamos que a maioria dos eletrodomésticos, em funcionamento normal, apresenta algum aquecimento, mesmo não sendo aparelhos aquecedores. Em eletrônica, representa-se tal comportamento pela resistência dos circuitos. Seu equivalente mecânico é o atrito, como aquele com o chão, que devemos vencer para empurrar um móvel. Se estivermos andando contra o vento e abrirmos um guarda-chuva, nosso atrito com o ar aumenta, exigindo maior esforço para caminharmos.

O guarda-chuva aberto aumenta o atrito com o ar. É o equivalente a uma maior resistência elétrica.

Percebemos, numa conversa agradável e fluida que mantenhamos com alguém, uma baixa “resistência” na troca de ideias. Por outro lado, com uma pessoa com quem tenhamos dificuldade de entendimento, até breves conversações são cansativas, parecem consumir energia demasiada e não raro geram mais “calor” do que fluxo de comunicações — é um circuito de comunicação com alta resistência.

Como pontua André Luiz nos capítulos 6 e 7 de “Mecanismos da Mediunidade”, há, no circuito mediúnico, a resistência correspondente a uma “dissipação de energia mental, destinada à sustentação de base entre o Espírito comunicante e o médium”, mas pode também ocorrer um consumo pouco útil de energia, um obstáculo à comunicação, proveniente de “inibições ou desatenções do médium, dificultando o equilíbrio no circuito mediúnico”.


Concluindo...

Evoluir intelectual e moralmente representa elevar nossas comunicações, ou seja, estabelecer os melhores “circuitos”, com ambas as esferas da existência humana. Diminuamos a resistência ao entendimento com nossos opositores; disciplinemo-nos para não causar “faíscas” ao interromper os outros; meditemos a fim de filtrar ruídos transitórios de torrentes de ideias — e estabeleçamos circuitos de comunicação plena de Luz e elevada inspiração com a Espiritualidade Superior, sob a orientação de Jesus.


Leia também, neste blog, as postagens, “Influência do Meio”, “Faixas” e “Muitas Moradas”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:

[1] DONNE, John. “Meditation XVII”. Disponível em http://www.luminarium.org/sevenlit/donne/meditation17.php. Acesso em 17/05/2010.
[2] XAVIER, Francisco Cândido e VIEIRA, Waldo. “Mecanismos da Mediunidade”. Pelo Espírito André Luiz. 14ª ed. Rio de Janeiro: RJ, FEB, 1995. Capítulos 6 e 7.
[3] d’ESPÉRANCE, Elisabeth. “No País das Sombras”. Rio de Janeiro, RJ. FEB, 1974. Capítulo XXI.

sábado, 15 de maio de 2010

“Pequenos” Erros

Somos Espíritos perfectíveis, porém ainda imperfeitos, e cometemos erros, pelos quais somos responsáveis de maneira proporcional ao nosso esclarecimento (“O Livro dos Espíritos”, questão 637). Ciente disso, Deus concede a graça de uma porta aberta para o arrependimento (“O Livro dos Espíritos”, questão 171), e daí a finalidade da reencarnação, abordada em “O Livro dos Espíritos”, capítulo IV, especialmente à questão 167. O estado evolutivo de um planeta é a média evolutiva dos habitantes, dos dois lados da vida, daquele mesmo orbe. Melhorando-nos, faremos o próprio planeta evoluir. Nossos erros, como os demais desafios que enfrentamos em nossas vidas, podem ser vistos como oportunidades de aprendizado ou como “castigos”. A primeira forma permitirá que aprendamos com os erros, superando-os, enquanto que a segunda poderá implicar nova ocorrência de problemas e erros similares, até decidirmos encará-los da primeira maneira.

Allan Kardec pontua, na 1ª parte do capítulo VII da obra “O Céu e o Inferno”, os passos para um efetivo afastamento do erro: arrependimento, expiação e reparação.

Nos estudos doutrinários, é necessário percebermos e evitarmos “pequenos” erros, como, por exemplo:
  • Em estudos e palestras, citar, muitas vezes de maneira inconsciente, Jesus e Deus de forma indistinta, evidenciando a presença íntima de resquícios de itens do Credo de Niceia em desacordo não só com a Doutrina Espírita, mas com diversas citações evangélicas, como Marcos 10:18, João 14:16 etc.;
  • Fazer afirmativas, supostamente da Codificação Espírita ou de autores de reconhecida colaboração em obras subsidiárias, sem preocupação em ser conferida a fonte e exatidão das assertivas. Dessa forma, afirmações nunca proferidas por tais autores ou mesmo ideias contrárias ao Espiritismo são propagadas sob um falso respaldo, e prestando um desserviço aos corretos ensino e divulgação doutrinários;
  • Citar obras de Francisco Cândido Xavier como sendo de autoria dele, sem referência alguma aos autores do Mundo Espiritual, em contradição com tudo que Chico Xavier sempre afirmou e reforçando mais o ídolo, em detrimento do brilhante exemplo de humildade e dedicação apresentado por esse apóstolo;
  • Sem análise mais apurada, encaminhar e/ou citar mensagens, as quais, embora atribuídas a Espíritos de escol, anunciam calamidades iminentes, em mensagens destituídas de palavras de consolo e esperança. Espíritos de maior elevação moral, em suas comunicações, sempre buscam nossa elevação.
Do preciosismo exagerado e menos útil à conivência perigosa com desvios aparentemente pequenos, os quais, em médio e longo prazo, trazem importantes distorções de entendimento, há uma sutil linha divisória. A Engenharia também nos informa que grandes desastres não ocorrem por apenas um erro, mas em consequência de uma série deles. Vejamos, abaixo, um pequeno exemplo matemático. Se, em nos dirigindo a um determinado local, desviarmos a trajetória de “apenas” um grau (1°), um aparente insignificante erro angular, e nos mantivermos nesse caminho desviado, erramos poucos milímetros do destino em um passo, mas, transcorrendo distâncias maiores, podemos errar até o nosso país de destino:


Relevante, outrossim, lembrar que o termo “pecado”, originado das palavras hamartia do grego e peccatu do latim, significava, meramente, erro, como o que se comete ao enganar-se em um caminho para determinado local, sem conotação de ofensa a Deus ou indução à sensação de culpa. As vibrações da culpa e do remorso podem nos atrasar a evolução, por não nos perdoarmos, travando nossa própria marcha, como André Luiz esclarece em duas seções da obra "Evolução em Dois Mundos": 1ª parte, capítulo 16; e 2ª parte, capítulo 19.


Leia, também, as postagens “Espiritismo e Internet”, “Muitas Moradas” e “Pecado — Hamartia — Peccatu”, neste blog.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


segunda-feira, 10 de maio de 2010

O Universo Cíclico

Houve um início no Universo em que vivemos? Haverá um fim? E, se houver, o que acontecerá após isso?

“A Natureza jamais se encontra em oposição a si mesma. Uma só é a divisa do brasão do Universo: unidade-variedade. Remontando à escala dos mundos, encontra-se unidade de harmonia e de criação, ao mesmo tempo que uma variedade infinita no imenso jardim de estrelas. Percorrendo os degraus da vida, desde o último dos seres até Deus, patenteia-se a grande lei de continuidade. Considerando as forças em si mesmas, pode-se formar com elas uma série, cuja resultante, confundindo-se com a geratriz, é a lei universal.” [1]

“Mas vide, ouvi meu discurso! Pois tende certeza, o aprendizado irá aumentar a vossa compreensão. Como eu disse antes, revelando os objetivos de meu discurso, vou contar-vos de um duplo processo. Em um tempo, este se multiplicou de modo a ser Um, a partir de Muitos; em outro momento expandiu, de forma a se tornar Muitos, a partir de Um.” [2]

“Toda vez que o ciclo de uma era cósmica termina, retorna a Natureza à sua origem; e quando o meu poder emite o verbo criador, reinicia-se o curso dos fenômenos do mundo.” [3]

“Com o tempo, as fórmulas acadêmicas se renovarão em outros conceitos da realidade transcendente, e os físicos da Terra não poderão dispensar Deus nas suas ilações, reintegrando a Natureza na sua posição de campo passivo, onde a inteligência divina se manifesta.” [4]

“Eu quero saber como Deus criou este mundo. Não estou interessado neste ou naquele fenômeno, no espectro deste ou daquele elemento. Eu quero conhecer Seus pensamentos; o resto são detalhes.” (Albert Einstein)

A ciência e as religiões buscam entender, na medida dos limites intelectual e moral da Humanidade terrestre, como o Universo foi criado. A Doutrina Espírita, em seu tríplice aspecto de ciência, filosofia e religião, reconhece que as criaturas de Deus não têm alcance para entender na plenitude os desígnios do Criador; não obstante, devem buscar evoluir e desenvolver seu entendimento. O Espiritismo, assim, analisa este tema, mormente na obra “A Gênese”.

No livro supracitado, em trecho do capítulo VI, intitulado “Uranografia Geral”, assinado por Galileu, este Espírito compartilha parte de seu conhecimento e humildemente assinala não ter ciência plena de tudo, discorrendo sobre o início do Universo. Galileu salienta haver sucessivos focos de criação, os quais trazem consequências para a posteridade dos estabelecimentos de vida, como vemos a seguir:
“O começo absoluto das coisas remonta, pois, a Deus. As sucessivas aparições delas no domínio da existência constituem a ordem da criação perpétua. (...)
O poder criador nunca se contradiz e, como todas as coisas, o Universo nasceu criança. Revestido das leis mencionadas acima e da impulsão inicial inerente à sua formação mesma, a matéria cósmica primitiva fez que sucessivamente nascessem turbilhões, aglomerações desse fluido difuso, amontoados de matéria nebulosa que se cindiram por si próprios e se modificaram ao infinito para gerar, nas regiões incomensuráveis da amplidão, diversos centros de criações simultâneas ou sucessivas.
Em virtude das forças que predominaram sobre um ou sobre outro deles e das circunstâncias ulteriores que presidiram aos seus desenvolvimentos, esses centros primitivos se tornaram focos de uma vida especial (...)” [5]

Galileu também lembra que, a essa sequência temporal de eventos, preside a eternidade, na qual diversos episódios de criação, por ora além de nossa capacidade de conhecimento e entendimento, ocorrem:
“Ainda uma vez; compreendamos melhor a Natureza. Saibamos que atrás de nós, como à nossa frente, está a eternidade, que o espaço é teatro de inimaginável sucessão e simultaneidade de criações.” [6]

Anel de matéria escura no cluster ZwCl0024+1652. Fonte: http://www.spacetelescope.org/images/heic0709a/

Segundo avaliações da radiação cósmica de fundo, efetuadas pela NASA, o Universo, como o conhecemos, existe há 13,7 bilhões de anos. A teoria do “Big Bang” diz que uma grande explosão, a partir de um ponto infinitamente denso e quente, gerou o Universo. Mas, e antes dessa grande explosão, havia algo além de Deus? E essa expansão continuará indefinidamente?

Uma teoria científica [7] afirma que o Universo, periodicamente, passa por ciclos de expansão e retração. Esta teoria havia estacionado, devido a não haver um modelamento adequado da Força de Gravidade para lhe trazer uma linguagem adequada. Com o surgimento da Teoria das Cordas (vide a postagem “A Prece (2)” e as páginas da Wikipédia sobre Teoria das Cordas e sua extensão, a Teoria-M), um entendimento mais profundo e integrado da Gravidade permitiu que a visão cíclica do Universo progredisse.

Em essência, a Teoria do Universo Cíclico afirma que:

  • Espaço e tempo existem há um tempo indefinido, o qual, para nossa referência, parece ser eternamente;
  • A temperatura e densidade do Universo não são infinitas em nenhum momento;
  • O “Big Bang” não é o começo do tempo; antes, é uma ponte para uma era de contração preexistente;
  • O Universo sofre uma interminável sequência de ciclos nos quais ele contrai em um “big crunch” e reemerge em um “big bang” de expansão, com trilhões de anos de evolução entre os mesmos;
  • As atuais homogeneidade e planificação do universo, bem como sementes para a formação das galáxias, foram criadas por eventos que ocorreram antes do “big bang” mais recente.
Segundo essa teoria, o Universo é composto por duas membranas (superfícies), delimitando uma dimensão extra, e os ciclos de retração e expansão universais correspondem a colisões e afastamentos dessas membranas. Há eras em que, durante a expansão, diferentes tipos de matérias ou radiação predominam, culminando em nova retração do Universo, a qual traz as bases para a expansão seguinte [8].

Essa não foi a primeira vez que a Humanidade foi apresentada a essa ideia. Na cosmologia hindu, o universo também apresenta uma natureza cíclica. A unidade de medida de tempo utilizada pelos hindus é a “kalpa”, a qual equivale a aproximadamente 4,32 bilhões de anos. [9]. Na visão hinduísta, o Deus da Criação, denominado Brahma, é criado por Vishnu e tem ciclos de vida de 100 períodos, cada período correspondente a 360 “dias”, cada “dia” correspondente a duas kalpas ou duas vezes 4,32 bilhões de anos. Dessa forma, um ciclo de vida de Brahma corresponde a 311 trilhões e 40 bilhões de anos. Ordens de grandeza temporais similares foram apontadas na Teoria do Universo Cíclico.

O poder de Deus nunca se contradiz. O Universo, Princípio Material, em incontáveis períodos, oscilou entre a grandiosidade a se expandir e um humilde ponto em formação, cujas novas condições serão afetadas pelo ciclo anterior de expansão e retração. Cada ser humano, Princípio Inteligente, de forma análoga ao Princípio Material, periodicamente oscila entre uma pessoa plenamente formada e uma célula-ovo, cuja nova história do Espírito animando nova personalidade, será afetada pelas ocorrências anteriores em seus ciclos de expansão (nascimento terrestre) e retração (desenlace e preparo para uma nova reencarnação).

Vivemos em um planeta que não passa de pequeno cômodo, de modesto apartamento, em um dos edifícios da criação de Deus. Como pequena parte do todo, façamos nossa parte, praticando o Bem e, assim, trazendo implicações positivas, tanto no microcosmo de nossas existências futuras, como no macrocosmo das novas existências do próprio Universo.


Leia também, neste blog, as postagens “Por que Deus criou a nós e o Universo?”, “Fluido Universal”, “Evolução Espiritual de Longo Prazo” e “A Prece (2)”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio


Referências:

[1] KARDEC, Allan. “A Gênese”. 34ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Capítulo VI, item 11.
[2] Empédocles. “Da Natureza”, item 17. Disponível em http://www.sacred-texts.com/cla/app/app26.htm. Acesso em 10/05/2010.
[3] “Bhagavad Gita”. Tradução de Huberto Rohden. São Paulo: SP, 2004. Capítulo 9, item 7
[4] XAVIER, Francisco Cândido. “O Consolador”. Pelo Espírito Emmanuel. 25. ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 2004. Questão 17.
[5] KARDEC, Allan. “A Gênese”. 34ª ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 1991. Capítulo VI, item 15.
[6] Ibidem, item 16.
[7] STEINHARDT, Paul J. “The Endless Universe: Introduction to the Cyclic Universe”. Disponível em http://www.actionbioscience.org/newfrontiers/steinhardt.html. Acesso em 10/05/2010.
[8] STEINHARDT, Paul J. e TUROK, Neil. “The Cyclic Universe: An Informal Introduction”. Disponível em http://arxiv.org/abs/astro-ph/0204479v1. Acesso em 10/05/2010.
[9] Observatório Nacional. “A Cosmologia dos povos antigos”. Disponível em http://www.on.br/site_edu_dist_2006/pdf/modulo1/cosmologia-povos-antigos.pdf. Acesso em 10/05/2010.