quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Amar os inimigos

Os Espíritos Superiores, respondendo a Kardec à questão 887 [1], dizem que: “Certo ninguém pode votar aos seus inimigos um amor terno e apaixonado. Não foi isso o que Jesus entendeu de dizer. Amar os inimigos é perdoar-lhes e lhes retribuir o mal com o bem. O que assim procede se torna superior aos seus inimigos, ao passo que abaixo deles se coloca, se procura tomar vingança.”

Ainda em “O Evangelho Segundo o Espiritismo” [2], Kardec comenta que: “Se o amor do próximo constitui o princípio da caridade, amar os inimigos é a mais sublime aplicação desse princípio, porquanto a posse de tal virtude representa uma das maiores vitórias alcançadas contra o egoísmo e o orgulho. Entretanto, há geralmente equívoco no tocante ao sentido da palavra amar, neste passo. Não pretendeu Jesus, assim falando, que cada um de nós tenha para com o seu inimigo a ternura que dispensa a um irmão ou amigo. A ternura pressupõe confiança; ora, ninguém pode depositar confiança numa pessoa, sabendo que esta lhe quer mal; ninguém pode ter para com ela expansões de amizade, sabendo-a capaz de abusar dessa atitude. Entre pessoas que desconfiam umas das outras, não pode haver essas manifestações de simpatia que existem entre as que comungam nas mesmas ideias. Enfim, ninguém pode sentir, em estar com um inimigo, prazer igual ao que sente na companhia de um amigo. A diversidade na maneira de sentir, nessas duas circunstâncias diferentes, resulta mesmo de uma lei física: a da assimilação e da repulsão dos fluidos. O pensamento malévolo determina uma corrente fluídica que impressiona penosamente. O pensamento benévolo nos envolve num agradável eflúvio. Daí a diferença das sensações que se experimenta à aproximação de um amigo ou de um inimigo. Amar os inimigos não pode, pois, significar que não se deva estabelecer diferença alguma entre eles e os amigos. Se este preceito parece de difícil prática, impossível mesmo, é apenas por entender-se falsamente que ele manda se dê no coração, assim ao amigo, como ao inimigo, o mesmo lugar. Uma vez que a pobreza da linguagem humana obriga a que nos sirvamos do mesmo termo para exprimir matizes diversos de um sentimento, à razão cabe estabelecer as diferenças, conforme aos casos. Amar os inimigos não é, portanto, ter-lhes uma afeição que não está na natureza, visto que o contacto de um inimigo nos faz bater o coração de modo muito diverso do seu bater, ao contacto de um amigo. Amar os inimigos é não lhes guardar ódio, nem rancor, nem desejos de vingança; é perdoar-lhes, sem pensamento oculto e sem condições, o mal que nos causem; é não opor nenhum obstáculo a reconciliação com eles; é desejar-lhes o bem e não o mal; é experimentar júbilo, em vez de pesar, com o bem que lhes advenha; é socorrê-los, em se apresentando ocasião; é abster-se, quer por palavras, quer por atos, de tudo o que os possa prejudicar; é, finalmente, retribuir-lhes sempre o mal com o bem, sem a intenção de os humilhar. Quem assim procede preenche as condições do mandamento: Amai os vossos inimigos.”



Carlos Torres Pastorino [3], comentando as passagens evangélicas relativas a esse tema (Mateus 5: 43-48 e Lucas 6: 27-36), diz: “Vem agora o aperfeiçoamento da lei do amor, levada ao máximo. Moisés ordenara: ‘ama teu próximo como a ti mesmo’ (Lev. 19:18) e ‘ama o estrangeiro e peregrino como a ti mesmo’ (Lev. 19:34 e Deut. 10:19). No entanto, em diversos trechos dizia-se que deviam ser olhados como inimigos os amonitas e moabitas (Deut. 23:03-06), os amalecitas (Êx. 17:14 e Deut. 25:19), o que fazia supor que esses povos deviam ser aborrecidos. Embora em Provérbios (25:21-22) já estivesse escrito: ‘Se teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer e se tiver sede, dá-lhe de beber, porque lhe amontoarás brasas vivas sobre a cabeça e YHWH te recompensará’, não era esse o hábito entre os israelitas. (Conforme ainda Provérbios 20:22, onde se reprime a vingança. Também em Deuteronômio 32:35, YHWH reserva para si a vingança e a recompensa, declarando explicitamente a lei do carma e o choque de retorno). Jesus chega ao clímax de Suas instruções, ordenando que os inimigos devem ser amados, e não apenas perdoados; que se deve fazer bem a quem nos faça o mal; que se deve abençoar os que nos amaldiçoam e orar pelos que nos difamam ou perseguem, e isto, para seguir o exemplo do Pai, que é PAI DE TODOS e sobre bons e maus faz surgir o sol e vir o benefício das chuvas. Com efeito, aí reside a sabedoria. Figurando o mal pelo negativo (-1) e o bem pelo positivo (+1), e o perdão pelo 0 (zero), temos as seguintes equações:

(-1) + (-1) = -2 - mal feito mais mal retribuído = mal duplo
(-1) + 0 = -1 - mal feito mais perdão = 1 mal
(-1) + (+1) = 0 - mal feito mais benefício prestado = mal anulado.

Então, matematicamente se prova que só o bem praticado em favor de quem nos faça o mal é que consegue extirpar a dor e o sofrimento da face da Terra. (...) Vem o fecho de Lucas: ‘sede misericordiosos como o Pai celestial’, e o outro, ainda mais rigoroso, de Mateus: ‘sede PERFEITOS, como perfeito é o Pai celestial’. Aqui o ensinamento de Jesus atinge o ápice da perfeição, superando tudo o que os antigos tinham podido ensinar. A lição prossegue no mesmo tom da anterior, mas as verdades são mais explicitamente ensinadas. Trata-se mesmo de amar os inimigos, que são, na realidade, nossos maiores benfeitores, pois nos ajudam a evoluir mais rápida e seguramente, limando nossas arestas, quebrando nossos espinhos, limpando-nos de nossos defeitos. Está claramente dito que, para ser cristão não basta ‘fazer como os outros’, retribuindo com bondade e gratidão aos benefícios recebidos com alegria para nós; mas retribuindo com a mesma bondade e gratidão aos ‘benefícios’ que recebemos com lágrimas, porque nos fazem sofrer. Indispensável atingir a perfeição absoluta. E ninguém fica isento de aperfeiçoar-se: a exigência abarca todos os cristãos.”

Concluímos, assim, que amar os inimigos significa agir com bondade em relação a eles, neutralizando o mal praticado e caminhando para o aperfeiçoamento moral, que é o “sede perfeitos como perfeito é o vosso Pai”.

A respeito do tema, leia também, neste blog, as postagens “Amar o Próximo”, “Reconciliação”, “A Influência de ‘Maus’ Espíritos” e “Egos virtuosos e Eus sapientes”, “Caminha Alegremente” e “Os opositores da Doutrina Espírita”.


Bons estudos!
Carla e Hendrio



Referências:

1. KARDEC, Allan. “O Livro dos Espíritos”. 1ª ed. Comemorativa do Sesquicentenário do lançamento de O Livro dos Espíritos. Rio de Janeiro, RJ: FEB. 2007. Questão 887.
2. KARDEC, Allan. “O Evangelho Segundo o Espiritismo”. 2ª ed. de bolso. Rio de Janeiro: RJ, FEB: 1999. Capítulo XII, item 3.
3. PASTORINO, Carlos Torres. “Sabedoria do Evangelho”. Rio de Janeiro, RJ: Sabedoria, 1964. Volume 2. “Amor ao Próximo”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Olá! Divida conosco seus estudos e opiniões!